Quando, n’algum lugar da imensa floresta tropical amazônica, uma experiência consegue reunir pesquisadores, instituições e pequenos produtores, no intuito de gerar renda com o manejo dum produto oriundo do ecossistema florestal – e, contra todas as probabilidades, consegue ser bem sucedida -, essa experiência merece, no mínimo, ser objeto de registro.

Afinal, ainda que a região seja rica em experiências comunitárias envolvendo recursos florestais e o seu respectivo manejo, poucas são as que chegam a ter alguma perenidade – nem sempre é possível munir a produção das condições necessárias para resistir aos variados entraves que surgem no cotidiano da atividade florestal na Amazônia.

Exigências não faltam, e todas – ou quase todas – travam o manejo florestal praticado por comunidades amazônidas. Tais obstáculos envolvem requisitos normativos (quase sempre exagerados e ineficazes), exigências de mercado (de regra insuperáveis pelas comunidades), estipulações ambientais (amiúde inalcançáveis e incompreensíveis para a realidade comunitária), e, por fim, regras trabalhistas impraticáveis.

E o fato de nada ser feito a respeito não deixa de ser um grande paradoxo, diante da circunstância – rara, é bom que se diga – de se contar com a presença dos elementos necessários para deslanchar-se a produção florestal comunitária, e cuja falta, esta sim, poderia ser motivo de agudas dificuldades. Com efeito, verifica-se, na conjuntura regional, o tripé formado por um farto ecossistema florestal, com incontáveis oportunidades de negócios; um promissor mercado que demanda por produtos florestais; e uma massa trabalhadora que, por tradição, é capaz de manejar a floresta, a fim de ofertar os produtos que podem virar negócios.

E a esse tripé pode ser acrescentado um ingrediente a mais, que é a tecnologia. Pois – ainda que alguns desavisados e poucos afetos à realidade amazônica insistam no contrário – não há problemas tecnológicos insuperáveis ou de comprometida solução.

Para entender melhor: existe tecnologia, compatível com a realidade das comunidades (em especial no que se refere à quantidade de trabalho disponível e à capacidade de investimentos), para exploração dos recursos da biodiversidade amazônica, de acordo com os ideais de sustentabilidade atualmente preconizados.

Ora, a reunião de todos esses fatores induz, inarredavelmente – e esse é o grande paradoxo -, a um questionamento: por que, então, as comunidades florestais amazônicas apresentam os piores índices de desenvolvimento humano, vivem numa eterna situação de exclusão, e não conseguem superar as limitações para alcançar uma produção florestal manejada?

A realidade, aliás, está bem distante dessa produção manejada. Na verdade, as comunidades de manejadores florestais costumam enveredar pelo nebuloso caminho-sem-volta da pecuária extensiva para criação de boi, exercendo uma atividade para a qual não estão preparadas, e que requer grandes áreas de terra (de preferência) desmatadas, infactíveis para o seu universo, ainda que num futuro próximo.

O paradoxo, dessa forma, permanece. O produtor amazônida não consegue ingressar ou se manter na atividade florestal, por razões que não envolvem a existência de recurso florestal, de trabalho, de investimento, ou de tecnologia. É impedido por forças alheias ao tripé da produção preconizado pela economia – uma combinação inusitada de preconceito (em relação ao manejador florestal e ao uso da biodiversidade) e de ausência de bom senso. Artifícios esses que não garantem a manutenção das espécies e tampouco possibilitam o seu uso econômico – o que, por sua vez, poderia trazer alguma esperança para a conservação da floresta.

O fato é que as causas que impedem o desenvolvimento da produção florestal comunitária não estão na floresta, mas, sim, no que acontece fora dela.

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