Quinto artigo da série RETROSPECTIVA SUSTENTABILIDADE DA AMAZÔNIA NA ÚLTIMA DÉCADA: 2010 a 2019 (publicado originalmente em 09/11/2014).

Na verdade, a manchete que ganhou os noticiários, como se fosse o fato mais normal e corriqueiro, que dispensasse qualquer tipo de questionamento, foi: “Zona Franca de Manaus prorrogada até 2073”. Até lá, a maior parte dos parlamentares que aprovaram a dilatação desse prazo (ou todos) provavelmente já vai ter morrido. Vão deixar as graves consequências de sua decisão para as próximas gerações.

Deve ser difícil encontrar na história recente dos países capitalistas um paralelo – ou seja, um caso de subvenção estatal concedida por mais de cem anos (1967/2073), em benefício de alguns setores produtivos.

Por meio de simples bom senso é fácil concluir que, se uma atividade econômica requer, para se viabilizar numa determinada região, um prazo tão longo de subvenção (leia–se isenção de tributos), é porque alguma coisa está errada. Muito errada.

Mas os parlamentares, por cegueira ou interesse pessoal, entenderam de forma diferente e, o pior, a imprensa também. Talvez por isso nenhum partido político ou autoridade pública, com ou sem mandato, tenha ousado se posicionar contrariamente à Emenda Constitucional 83/2014, aprovada por unanimidade no dia 05 de agosto.

O que mais impressiona nesse episódio é que a justificativa quanto à pretensa relevância econômica da Zona Franca de Manaus foi sendo, aos poucos, substituída por uma frágil – e insana – alegação relacionada a uma suposta importância ecológica das empresas ali atuantes. As montadoras de motocicleta, por exemplo?!

Procurou-se, a todo custo e por um caminho que fere o intelecto, defender que sem os benefícios fiscais, concedidos sob um alto custo para a sociedade, as montadoras de quinquilharias partiriam para outras regiões e, pasme-se!, o desmatamento aumentaria, causando a destruição da Amazônia.

Ora, em primeiro lugar, onde o desmatamento entra nessa história?

A importância da Amazônia, em especial no que se refere ao estoque de florestas e água, é uma verdade comprovada pela ciência. Da mesma forma, não há dúvida que o desmatamento da floresta resulta no comprometimento da quantidade e da qualidade da água produzida. Mas qualquer relação entre essas constatações e a permanência das montadoras na região foge ao raciocínio lógico.

Ainda assim, muitos dos defensores da zona franca alardearam o papel crucial da floresta amazônica na produção de água, no combate à estiagem, e assim por diante.

Em segundo lugar, esse argumento só poderia ter alguma validade se – e somente se – a intenção fosse a de ganhar tempo até a consolidação de alguma alternativa econômica baseada na biodiversidade. Pois é evidente que as montadoras vão partir para outra região quando não houver mais subsídios, ou quando os subsídios já não forem suficientes para tornar sua produção competitiva.

E, por uma série de razões que não cabem nesse artigo, é um completo absurdo supor que em 2073, quando as montadoras se forem, as indústrias, as de verdade, irão correr para Manaus, preferindo essa cidade a São Paulo ou a qualquer outra do Sudeste.

 Está no aproveitamento econômico da biodiversidade a chave para a manutenção do ecossistema florestal na Amazônia – o que poderá zerar, de forma definitiva, as persistentes taxas de desmatamento. Ademais, em termos de geração de emprego e renda, a exploração da diversidade biológica apresenta potencial bastante superior à produção de parafernálias.

A saída econômica e ecológica para a região se assenta num setor florestal forte e diversificado, como o que se propõe por meio do Centro de Biotecnologia da Amazônia, o CBA.

Porém, infelizmente, a urgência em se concretizar uma economia florestal na Amazônia vai ter que esperar bastante. Conversa para 2073.   

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