A confirmação científica (e reconhecimento político) quanto ao fato de que existe vinculação entre a existência (ou ausência) dos ecossistemas florestais e o equilíbrio (ou alteração) do clima levou a ONU a incentivar, por um lado, a ampliação das áreas de florestas plantadas, e, por outro, a promover a tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo como meio de garantir a manutenção das florestas nativas.

Dessa forma, no rastro da deliberação que proclamou 2011 como o Ano Internacional das Florestas, as nações foram instadas a rever sua atuação em relação aos ecossistemas florestais mundiais. Em âmbito nacional, portanto, ao que parece, finalmente será desencadeada a discussão sobre uma nova institucionalidade estatal que amplie a governança sobre os ativos florestais dispersos no território brasileiro.

Muito embora a maior parte dos países mantenha uma instituição pública (alguns, mais de uma) destinada a gerir os assuntos relacionados às florestas, na maioria dos casos – exceção feita a poucos, como Alemanha e Canadá -, essas instituições acumulam funções sobrepostas; de forma concomitante, por outro lado, persistem lacunas que não são supridas por nenhum outro órgão.

No Brasil, o tema concernente à produção de madeira em terras indígenas é um bom exemplo. Como se trata de uma atividade lucrativa, as populações indígenas (com todo o direito, por sinal) almejam entrar nesse mercado; todavia, e ainda que algumas já mesmo realizem a exploração madeireira em suas áreas, a Funai simplesmente se omite quanto à controvertida questão: ou finge que o problema não existe, ou, sob o pretexto da ilegalidade, transfere a responsabilidade ao Ibama – que, por sua vez, alega não ter jurisdição sobre as terras indígenas.

Com algumas diferenças, a história se repete no caso das Reservas Extrativistas. As populações tradicionais que vivem da exploração de algum tipo de recurso do ecossistema florestal, como borracha, castanha e babaçu, depois da criação da Reserva geralmente enfrentam dificuldades para continuar extraindo o recurso florestal.

Por mais paradoxal que pareça, os produtores se veem na bizarra situação de empenhar-se pela criação da unidade de conservação (o que exige grande esforço político das comunidades e de seus apoiadores), para, depois que logram obter a almejada regularização fundaria, ser-lhes retirado o direito de manter a sua histórica produção extrativista – produção esta, diga-se, que justificou a criação da Reserva.

Essa situação paradoxal existe justamente em razão da ausência de uma governança florestal com alçada sobre essas unidades. Por conta disso, não se prioriza – para ficar apenas num dos problemas – a elaboração do Plano de Manejo, instrumento obrigatório para a gestão das Reservas (e a realização da exploração florestal), nos termos da lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o Snuc.

Uma nova institucionalidade deve ser engendrada, portanto, para solucionar-se de modo definitivo esse tipo de entrave. Para se ter ideia do tamanho do problema, das 59 Reservas Extrativistas existentes no país, apenas 6 possuem plano de manejo.

Significa dizer que 53 Reservas Extrativistas – cujas áreas florestais e marinhas são maiores que o território de muitos estados nordestinos – não poderiam, a rigor, produzir coisa alguma. Ou seja, sob o aspecto legal, a atividade extrativista que legitimou a criação da Reserva Extrativista não poderia ser mantida.

O que se conclui é que o órgão incumbido de conduzir os assuntos relacionados às Reservas Extrativistas, ou enfrenta grande deficiência de pessoal e dinheiro, o que não deve ser o caso, ou não possui os atributos necessários para operar com as Unidades de Conservação de Uso Sustentável – o que certamente é o caso. O Instituto Chico Mendes para Conservação da Biodiversidade, o ICMBio, além de ter sido criado com esse nome disparatado, convive com uma série de vícios de origem que lhe obstam a atuação.

Esses vícios principiam com as atribuições do órgão, ditadas pela presunção de querer abarcar a biodiversidade nacional, quando deveriam se limitar às Unidades de Conservação, e findam com o enfoque preservacionista impregnado na instituição – que, entre outros equívocos, não admite que Reserva Extrativista seja Unidade de Conservação.

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