Não é tarefa fácil levar a efeito a votação de uma reforma política, quando os deputados estão concentrados em manter seus mandatos na eleição que se aproxima.

Por sinal, nessas horas parece faltar talento para a condução de debates envolvendo processos legislativos de grande envergadura, como demonstrou possuir o hoje tido como abominável ex-presidente da Câmara – aquele que, tal qual o inimigo de Harry Potter, não se pode nominar.

Ao que parece, poucos entenderam a estratégia dos parlamentares, ao distribuir os pontos polêmicos da reforma em duas PECs (Propostas de Emenda Constitucional).

Sem entrar na seara das conspirações, como gosta a mídia, diga-se que o propósito foi evitar que a rejeição da reforma ampla e desejável (prevista na PEC 77/03) comprometesse a aprovação da reforma possível (PEC 282/16), observando-se o prazo legal para promulgação pela Presidência da República (07 de outubro).

Como os resultados mostraram, a estratégia foi bem-sucedida. Os parlamentares rejeitaram os pontos polêmicos da reforma desejável logo de cara.

Não aceitaram, por exemplo, alterar o sistema eleitoral para a escolha de deputados e vereadores. Em 2018, portanto, os brasileiros continuarão a eleger deputados sem votos e, pior, permanecerão sem saber em quem realmente votaram.

Como também não se chegou a um consenso quanto ao volume de dinheiro público a ser aplicado no financiamento das eleições, continuaremos sem saber quanto dos impostos que pagamos vai ser usado para custear as campanhas eleitorais.

Desnecessário dizer que foi um erro rejeitar a doação de empresas, a título de coibir a corrupção. Sem o dinheiro das empresas, criou-se uma verdadeira encruzilhada, uma vez que a verba pública é a única saída, muito embora ninguém concorde em tresdobrar os recursos públicos destinados aos partidos. Por outro lado, como nada disso evita falcatruas, é o pior dos mundos: bancamos as campanhas dos políticos, enquanto a corrupção persiste.

Ao aprovar a reforma política possível, os congressistas obtiveram dois significativos avanços – que chegaram mesmo a ser considerados inalcançáveis, diante da indisposição dos partidos ditos de esquerda para aprovar qualquer coisa.

O primeiro desses avanços foi o fim das coligações. Uma medida de suma importância, já que a possibilidade de os partidos se coligarem, distribuindo os votos que recebem entre candidatos de um sem-número de agremiações, configura uma aberração, uma permissividade eleitoral das mais absurdas.

O segundo foi a imposição de uma cláusula de barreira para acesso ao Fundo Partidário. Acontece que depois que esse fundo, ainda em 2015, alcançou a soma de R$ 867.500.000,00, não resta dúvida: criar um partido tornou-se um negócio muito bom, a ponto de ser necessário frear o intenso processo de criação de novas legendas que teve lugar nos últimos anos – incentivado, é óbvio, pelo dinheiro público.

Dessa forma, foi estabelecido um piso mínimo de votos, que deve ser atingido pelos partidos, sob pena de ser-lhes negado acesso ao Fundo Partidário e ao caríssimo horário eleitoral no rádio e na TV.

Apresentada originalmente pelos senadores Aécio Neves e Ricardo Ferraço, a PEC 282/16 voltará ao Senado, onde será votada em dois turnos.

Sob a incompreensão da imprensa e a pressão de infindáveis – e às vezes irresponsáveis – denúncias, a reforma política aprovada não foi a ideal, mas nem por isso deixa de ser indispensável.

A despeito de não atender aos anseios expressados nas manifestações de 2013, deve tirar da TV candidatos e partidos desnecessários. O que já é um começo.

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