O ambientalismo, desde o seu surgimento, e mais especialmente no início do século XX, debate-se entre o preservacionismo e o conservacionismo. O primeiro – mais radical e ortodoxo -, voltado para o impedimento da extinção de espécies, com caráter explicitamente protetor, tem na criação de parques e reservas – nas quais não é permitida a presença humana – sua maior bandeira.

Já o segundo, de caráter desenvolvimentista, com uma faceta nitidamente reformista, acredita na possibilidade de uso racional e sustentável dos ecossistemas de forma duradoura. Nos ideais do desenvolvimento sustentável residem suas proposições.

Essas duas correntes do ambientalismo foram se desenvolvendo de forma paralela ao longo do tempo, tendo sido evitado o confronto direto. Na verdade, quando está em jogo uma causa maior, como barrar um modelo de crescimento indiscutivelmente prejudicial ao meio ambiente, geralmente o que ocorre é a união entre elas. Salvo em raros momentos de conflitos, antecipados no ambiente norte americano, as duas correntes convivem de forma não agressiva.

No entanto, um confronto inevitável surge quando se intensificam as discussões acerca da criação de unidades de conservação na Amazônia. Foi o que ocorreu e continua ocorrendo, nas negociações que envolvem a execução do Projeto de Áreas Protegidas da Amazônia – Projeto ARPA, que tem como meta a destinação de 10% da área da região para a criação de unidades de conservação, o ponto de discórdia ocorre justamente quanto aos tipos de unidades a serem criadas.

Numa queda de braço, em que de um lado situaram-se preservacionistas do Banco Mundial e organizações internacionais, e de outro, os representantes dos movimentos sociais – Conselho Nacional dos seringueiros/CNS e Grupo de Trabalho Amazônico/GTA -, chegou-se a um consenso pelo qual metade da área seria destinada às unidades de proteção integral e metade às unidades de uso sustentável, nos termos da classificação definida na Lei que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – Snuc.

O sentimento de pureza ecossistêmica herdado do modelo americano de terras selvagens cria resistências insuperáveis no meio preservacionista. Um sentimento que teve origem no conceito de floresta concebido ainda no século XVII, quando a floresta era considerada: virgem, terrível, sombria, selvagem, deserta, agreste, melancólica, desabitada e assolada por feras.

De outra banda, os conservacionistas deparam-se com uma grande demanda dos movimentos sociais para atendimento. Mas tudo indica que o caminho natural levará a uma preferência pelo conservacionismo. É difícil defender a criação de áreas intocáveis, a não ser em casos de profundo interesse biológico e de elevados riscos de extinção e, ainda, onde haja possibilidade concreta de funcionamento de um oneroso aparato de fiscalização, pesado e permanente.

No caso do Brasil, a situação é ainda mais grave. Enquanto os americanos consentem a visitação pública, o que gera fundos para a manutenção das áreas, aqui, nem isso era permitido. Atualmente, com a abertura dos Parques ao uso público, mediante o instrumento de concessão a terceiros privados, foi possível auferir rendimentos nessas áreas, trazendo-as para o sistema produtivo aos olhos da economia. Isso representa um passo importante no rumo do conservacionismo e do desenvolvimento sustentável.

Não obstante, os preservacionistas podem contar com aliados importantes, que são os funcionários de órgãos ambientais em esfera federal e estadual. Em sua maioria, esses funcionários são contrários à possibilidade de as unidades de conservação terem sua gestão compartilhada. Talvez por entenderem que o órgão perde prestígio quando compartilha a gestão da unidade, o fato é que colocam empecilhos em quaisquer tipos de co-gestão. Em outro viés, também são radicais quanto à não presença humana nas unidades de proteção integral, talvez porque considerem que seriam os únicos em condições de administrá-las.

No final das contas, esse preciosismo injustificável do ponto de vista técnico – mas perfeitamente compreensível do ponto de vista político institucional -, acaba por tornar a unidade inimiga das populações que vivem no seu entorno e por possibilitar que, na primeira oportunidade, sua existência seja questionada por políticos locais ávidos por colher os frutos da insatisfação popular. Por outro lado, como o órgão não possui as mínimas condições para manter a intocabilidade que preconiza, estabelece-se um ciclo de invasão/desintrusão, sem que se chegue a lugar algum.

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