O surgimento das organizações não governamentais foi um fenômeno mundial, intensificado após a Segunda Guerra. Numa Alemanha destruída, a máxima do eficaz planejamento alemão era que “se existe uma organização da sociedade prestando um serviço público, é melhor que o Estado lhe dê recursos para ampliar e diversificar sua capacidade de atendimento”.

Ou seja, o Estado, reconhecendo seus limites institucionais para atender a demanda da sociedade, assumia o compromisso de prover os meios, físicos e financeiros, para que essa demanda fosse atendida pela própria organização popular.

O mundo, no geral, também pensa assim. Somente para citar um exemplo, a Organização das Nações Unidas, ONU, instiga todos os países membros a promoverem o que chama de iniciativa popular, por meio da criação das ONGs. Acredita-se – e as estatísticas comprovam – que, mediante o protagonismo das sociedades, o atendimento das demandas sociais é realizado de forma mais transparente e barata.

No Brasil, sempre houve ONGs, embora nem sempre com tal denominação. O regime militar fez uso do sindicalismo para sua sustentação. Sindicatos, para quem não sabe, são ONGs. Após a democratização, ganharam força as entidades filantrópicas, que, por sinal, gozam de regalias fiscais únicas. Para quem não sabe, entidades filantrópicas, como a APAE, são ONGs. Vasco, Fluminense e Flamengo já completam mais de cem anos. Para quem não sabe, os clubes de futebol são ONGs.

Uma tentativa – louvável, diga-se – de institucionalização desse grande saco de gatos foi realizada no período do Programa Comunidade Solidária, durante os oito anos do governo FHC. Um marco legal foi estabelecido, com aprovação da legislação que instituiu a figura da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, a Oscip.

A ONG poderia ser qualificada como Oscip desde que cumprisse determinados requisitos de transparência e de gestão, adequados à administração de recursos públicos. Criou-se um mecanismo de repasse de dinheiro público, dos órgãos do governo para as entidades, o Termo de Parceria, que, em tese, deveria superar as relações de favorecimento estabelecidas entre os agentes nos famigerados Convênios.

Enquanto isso, o Congresso peleava na discussão infrutífera acerca da atuação das ONGs na Amazônia. Numa terra onde a presença pública é relativizada ao máximo, as organizações sociais se transformam em um alento para as comunidades. Todavia, como algumas dessas organizações (pouquíssimas, aliás) são dirigidas por estrangeiros, o fantasma do imperialismo americano e da agressão à soberania foi transformado em histeria. Uma CPI foi criada e, para variar, não deu em nada.

A partir de 2003, a presença das ONGs, que contribuíram, em tese, para eleição de um governo de esquerda, foi colocada em cheque. As organizações, pelo menos a maioria delas, não sabiam que a esquerda não acreditava nelas.

Esquecem-se todos os avanços, e surge nova CPI, destinada a apurar repasses públicos para ONGs realizados desde 1999 – ou seja, não vai dar em nada novamente.

Mas, quais razões para que o público, no Brasil, considere a atuação dessas entidades como conspiração ou contravenção, ou ainda corrupção, quando o mundo incentiva a criação das ONGs? Quem sabe?

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