São raros os casos nos quais o Prêmio Nobel da Paz é concedido para pessoas ou instituições que atuam fora dos temas da cooperação internacional voltada à promoção da compreensão, caridade e da paz (entendendo paz como ausência de conflitos ou de guerra). Em 2005, por exemplo, o vencedor foi a própria agência da ONU (Organização das Nações Unidas) destinada ao monitoramento da não proliferação do armamento nuclear no mundo. Talvez por isso, a premiação do indiano Muhammad Yunus e de seu Banco Grameen representam uma grata e profícua surpresa.

Pensador e criador da Teoria do Microcrédito, Muhammad conseguiu o que poucos se atreveriam: estruturou o maior programa de microcrédito do mundo com capacidade para se viabilizar sem depender dos constantes aportes de recursos públicos. O segredo da teoria do microcrédito foi perceber que os pequenos tomadores de crédito, não só precisam de recursos para seus empreendimentos, como são disciplinados para honrarem seus compromissos de pagamento. Para o sistema oficial de crédito, o bancário, esse público não existia. O indiano provou que eles estavam completamente errados.

Muitos acreditam que o princípio conceitual do microcrédito se baseia na oferta de pequenas quantias de dinheiro. Mas essa não é a questão. O maior problema que o sistema financeiro oferece ao pequeno tomador é o acesso. Tudo começa com o assustador ambiente bancário, no qual esse tipo de empreendedor não esta habituado. Depois vêm as exigências de documentação que esse tomador também não possui. E por fim, as malditas garantias que ninguém, pelo menos a maioria, também não possui.

O microcrédito derruba esses três empecilhos. Primeiro leva o banco até a casa do empreendedor por meio da visita do agente de crédito. Depois, troca as exigências de documentação pela realização de um levantamento sócio-econômico que o agente e o tomador fazem em conjunto. E por fim, o mais importante, troca garantias burocráticas pelas de relacionamento. O contato do agente com a família do tomador e a percepção que esse agente tem da vida do tomador é a maior garantia do empréstimo. O resultado é um índice de inadimplência inferior a 5%. Um resultado inesperado para o próprio sistema financeiro.

As idéias do microcrédito ganharam o mundo como opção importante para redução das desigualdades sociais, da pobreza e agora para promoção da paz. Vincular exclusão e pobreza com violência, conflitos sociais e guerras, é o maior significado dessa premiação. No Brasil, o microcrédito vem sendo levado adiante às duras penas. As amarras legais existentes e o fantasma do assistencialismo político emperram sua multiplicação.

Em um primeiro momento, estruturou-se um programa de microcrédito por intermédio do Ministério do Desenvolvimento Social, de maneira associada aos programas sociais, como o de erradicação do trabalho infantil, bolsa família e assim por diante. O microcrédito oferecido nesse caso, variava com operações de até R$1.500,00 por família e uma anomalia perigosa: não cobra taxa de juros nas operações. Sua viabilidade depende do constante aporte de recursos públicos e seu custo operacional costuma ser elevado. Além, é claro, de terminar junto com o mandato do governo que o instituiu.

Em 2005, finalmente, com uma medida provisória, criou-se o Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado operado pelo BNDES. Agora sim sem os vícios da ausência das taxas de juros e com elevado potencial para se viabilizar no tempo.

Mas no Acre uma experiência bem sucedida foi desencadeada pelo programa CrediSelva operado pela Associação Andiroba. Trata-se, possivelmente, de um projeto único na Amazônia por duas razões: primeiro por ser totalmente operado por uma organização do terceiro setor; e, segundo, por se destinar a apoiar empreendimentos vinculados à atividade florestal.

A relevância e o esforço realizados pela Andiroba foram rapidamente compreendidos por várias organizações. Alguns exemplos são importantes como a premiação, na condição de finalista do Prêmio de Tecnologia Social da Fundação Banco do Brasil e o primeiro lugar brasileiro no Prêmio Internacional de Microfinanças, uma parceria entre o Grupo CitiBank e a ONU, ambos em 2005, além de ter sido selecionada para participar do Prêmio Empreendedor Social Ashoka – McKinsey 2006.

Quem sabe, em um futuro próximo, quando a ampliação da agropecuária sobre a floresta voltar a ganhar dimensões de conflitos sociais, o que já ocorreu no passado, o microcrédito florestal seja reconhecido como mecanismo imprescindível para promover a PAZ na região.

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