Existe uma dificuldade crônica para a imensa maioria dos brasileiros compreenderem a importância da separação dos três poderes republicanos e mais ainda para delimitar a função a ser desempenhada pelo Poder Judiciário e o Poder Legislativo.
Além de contaminar as opiniões de representantes de alto nível a separação dos poderes, ponto sensível ao processo democrático, retrocede sempre que, por exemplo, juízes impõem por normas legais ao que deveria ser discutido e aprovado pelos políticos. Exemplos não faltam.
Jornalistas de quase todas as empresas de mídia do país aplaudiram quando o Supremo Tribunal Federal, STF, preencheu a lacuna deixada pelo Congresso Nacional e recusou a tese do Marco Temporal para regularização fundiária de terras para os índios.
Uma discussão muito complexa e que poucos na imprensa conseguem entender. Não à toa, as notícias priorizaram a separação dos ministros do STF e, por tabela, de todas as pessoas que conseguem opinar sobre o assunto em contrários ou favoráveis aos próprios indígenas.
O que é, no mínimo, deplorável.
Por óbvio, um raciocínio simplório dos jornalistas, que foi republicado sem cerimônia e que se inicia com a afirmação, sem qualquer evidência, de uma suposta demanda do agronegócio, sempre tratado com preconceito incompreensível para um setor que representa quase 50% da economia do país, e que se encerra com o fim definitivo da demarcação de Terras Indígenas.
Nada disso é verdade ou tudo não passa de um grande equívoco e, justamente por isso, o STF não deveria se adiantar ao Poder Legislativo.
Não fosse a letargia dos senadores e não somente o Marco Temporal mas temas polêmicos como a exploração mineral e o arrendamento pelo agronegócio de Terras Indígenas estaria regulamentado de acordo com legislação aprovada pela Câmara dos Deputados, já faz um bom tempo.
O que está em jogo e ao mesmo tempo faz com que os parlamentares em Brasília sejam os principais e únicos responsáveis por uma regulamentação conclusiva é o modo como tratamos até hoje as Terras Indígenas e as populações que vivem lá.
A legislação já aprovada pelos deputados e que deve ser reforçada pelos senadores altera de maneira sensível as diretrizes propugnadas pela Funai e por parte expressiva de acadêmicos, em especial em universidades federais.
E, convenhamos, se de um lado os brasileiros são sensíveis à causa indígena e defensores da destinação de terras para sua sobrevivência, ninguém pode ser favorável a insegurança jurídica que impede o aporte de capital privado que, no curtíssimo prazo, deve melhorar o IDH das próprias populações indígenas.
Difícil entender as razões para que grupos políticos aplaudam a intervenção do STF. Alegam que vão perder no debate e na votação a ser travada no Congresso Nacional. Esquecem que, afinal, o nome desse embate é política, a arena onde o país consolida sua democracia.
Não foi diferente quando o Congresso Nacional impediu a transferência da Funai do Ministério da Justiça para um ministério que não terá vida longa. Os mesmos políticos, com apoio dos jornalistas, reagiram como uma afronta, ou um golpe, como gostam de repetir.
Mas, a Funai está no seu devido lugar institucional, vinculada ao Ministério da Justiça e foi a política, não os juízes, que conseguiu o melhor para o país.