Em 26 de abril último, a “Science”, uma das mais conceituadas revistas científicas do mundo, publicou documento elaborado por 602 cientistas conclamando a União Europeia a “deixar de importar o desmatamento”.

Trata-se de clara alusão ao mercado de carne bovina, cuja cadeia produtiva é responsável por mais de 80% do desmatamento praticado na Amazônia.

Os cientistas chamam a atenção da sociedade e governantes do continente europeu para um fato que de tão simples parece inusitado – a estreita relação entre consumo e sustentabilidade ecológica.

Desnecessário reforçar a importância do mercado europeu para a maioria das commodities exportadas pelos produtores brasileiros. É evidente, por outro lado, o efeito disciplinador que esse mercado exerce em todo o mundo.

Em outras palavras, significa o seguinte: (1) o consumidor europeu é fundamental para o agronegócio brasileiro; (2) esse mercado exige o fim do desmatamento na Amazônia; e, por último, (3) o que acontece na Europa repercute nos demais continentes, sobretudo na Ásia e na América.

Os 602 cientistas que assinam o manifesto, oriundos dos 28 países-membros da União Europeia, fizeram questão de especificar sua preocupação em relação a desmatamento, direitos dos povos indígenas e, talvez o mais inovador, certificação de origem da produção de commodities.

Em linhas gerais, reivindicam a certificação de origem, por exemplo, da carne de gado que o Brasil exporta para a Europa, a fim de rastrear se as florestas na Amazônia foram desmatadas para o cultivo da pastagem que alimentou o boi que originou a carne consumida no continente.

Assumindo uma exposição pública um tanto incomum no meio científico, os pesquisadores externam apreensão quanto à postura do novo governo brasileiro na defesa do agronegócio e em detrimento das salvaguardas ambientais que, em última instância, garantem mercado para o próprio agronegócio.

Eles são contundentes em seu posicionamento:

“Exortamos a União Europeia a fazer negociações comerciais com o Brasil sob as seguintes condições: a defesa da Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas; a melhora dos procedimentos para rastrear commodities no que concerne ao desmatamento e aos conflitos indígenas; e a consulta e obtenção do consentimento de povos indígenas e comunidades locais para definir estrita, social e ambientalmente os critérios para as commodities negociadas”.

O desmatamento da Amazônia é um dos principais responsáveis pelo aquecimento do planeta – que, por sua vez, altera o clima e põe em risco o próprio agronegócio. Trata-se de uma verdade científica comprovada por pesquisadores do mundo inteiro em seu trabalho cotidiano.

Duvidar de verdades científicas é uma estupidez que traz consequências sempre deletérias. No caso das mudanças climáticas, essas consequências vêm em forma de tragédias como alagações, secas e tsunamis.

Quando a mensagem não é escutada por quem produz, resta a imposição de barreiras comerciais.

O agronegócio brasileiro terá que se render aos padrões mundiais de sustentabilidade, por uma razão simples: é preciso ter para quem vender.

 

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