No rastro de medidas a serem anunciadas para que o Brasil retome o protagonismo para a política ambiental internacional, o BNDES anunciou o lançamento de edital com montante recorde de 450 milhões de reais para investir em projetos de reflorestamento na Amazônia.
Além de louvável, a iniciativa merece aplausos pela objetividade ao priorizar a tecnologia mais barata, rápida e com elevado impacto social para realidade amazônica quando o objetivo é retirar carbono da atmosfera e reduzir o aquecimento do planeta: plantio de árvores.
Mas aqui cabe um adendo, não se trata de uma proposta nova. Ou seja, em vários locais da Amazônia e desde a década de 1990 do século passado, várias experiências foram conduzidas com o propósito de reduzir o desmatamento devido à produção agrícola da região.
Foi o caso por exemplo do reflorestamento com a tecnologia usada no Projeto SAF & AÇUDE, considerado um sucesso para a realidade rural do Acre. Foi implantado em 1995 pela organização não governamental Centro dos Trabalhadores da Amazônia-CTA, que, infelizmente, encerrou suas atividades nos idos de 2010.
Naquela época o Ministério do Meio Ambiente tinha uma forte e jamais recuperada atuação no incentivo à execução de modelos alternativos de produção agrícola na Amazônia, sempre na expectativa de minimizar os efeitos e até zerar o desmatamento legalizado.
Entretanto, a chave para o resultado positivo do investimento do BNDES reside em entender as razões para que, contrariando o senso técnico comum, o pequeno produtor, que deve ser o principal beneficiário do plantio das árvores consorciadas com o milho, não quer dedicar seu tempo ao SAF.
Os relatórios do projeto SAF & AÇUDE mostram que quando os técnicos que atuavam no CTA chegavam às propriedades para realizar os plantios consorciados os produtores, sem exceção, ficavam muito animados com a ideia do açude no mesmo grau que decepcionados com a proposta do SAF.
De certo modo, com o decorrer da implantação do Projeto SAF & AÇUDE em 250 propriedades localizadas no vale do rio Acre, o plantio das mais de 25 espécies de árvores consorciadas no SAF se impôs como condição para os produtores ganharem o tão almejado açude.
E mais, o açude, medindo em média um hectare de lâmina de água, teria que atender a piscicultura de um conjunto de cinco famílias ou unidades produtivas diferentes.
Todos os produtores aceitaram satisfeitos as condições, visto que a construção do açude compensaria o sacrifício de lidar com a piscicultura coletiva e com o SAF individual (veja mais aqui http://www.andiroba.org.br/artigos/?post_id=1663).
Por sinal, com a introdução de alevinos, com destaque para tambaqui e curimatã nos açudes, a piscicultura deu seus primeiros passos e hoje está consolidada na realidade rural do Acre, ainda que dissociada do SAF.
Vencer a resistência do produtor com o SAF não é tarefa fácil por uma razão compreensível. Há lapso temporal considerável entre o período em que o produtor dispende seu trabalho até que as árvores se estabeleçam a ponto de gerar alguma renda.
O SAF & AÇUDE priorizou o produtor localizado em projetos de assentamentos da reforma agrária gerenciados pelo Incra, que emprega tecnologia agrícola rudimentar e desmata sua propriedade no limite permitido pelo Código Florestal.
Para esse produtor, que vive entre a vontade de ampliar a produção e o medo de entrar na ilegalidade ao desmatar a porção de Reserva Legal de sua propriedade, talvez interessasse modernizar por meio da diversificação, a sua produção agrícola com a tecnologia de reflorestamento do SAF.
A alternativa do SAF para esse tipo especial e peculiar de produtor do assentamento rural na Amazônia, se tornará atrativa na medida em que possibilite reduzir os custos de produção e propicie elevação da renda com a venda dos produtos colhidos no SAF após, no mínimo, os três anos necessários ao amadurecimento do plantio (veja mais aqui http://www.andiroba.org.br/artigos/?post_id=1707).
Ocorre que o SAF consorcia espécies vegetais com diferentes ciclos de vida em um mesmo hectare de plantio. Por isso sua cronologia produtiva pode permitir ao produtor auferir renda, com a área antes ociosa que foi abandonada no modelo de pousio, de maneira mais prolongada e permanente.
Do ponto de vista ecológico, o SAF, com espécies agrícolas e florestais cultivadas juntas, aproxima a área que foi desmatada daquele ecossistema florestal original.
Parabenizando o BNDES, torço para que os gestores do edital de reflorestamento reduzam o risco de fracasso e visitem o Projeto SAF & AÇUDE no Acre!
Antes de iniciar qualquer discussão jamais esqueça que a seca e alagação na Amazônia, eventos extremos que passaram a ocorrer em intervalos de tempo menores, são consequências do desmatamento.
Foi a partir do corte raso de grandes áreas de floresta, com pico na década de 1970, mas que se manteve todos os anos com recordes perigosos em 1995 e 2004, que fenômenos climáticos como El Nino potencializaram os efeitos do desmatamento transformando estiagem e cheias nas tragédias da seca e alagação, respectivamente.
Resumindo, esticar a corda no sentido de endurecer as regras, aumentar o investimento no sistema de comando e controle para alcançar o desmatamento zero, legalizado ou não, da Amazônia até 2030 deveria ser prioridade para os políticos.
Na COP 28, que começa em 30 de novembro de 2023 em Dubai, a expectativa dos brasileiros é que, sem poder contar com iniciativas promissoras nos nove governos estaduais, o Ministério do Meio Ambiente assuma as rédeas e a responsabilidade pelo desmatamento zero na Amazônia.
De nada vai adiantar repetir o discurso, cansativo diga-se, de que há um custo para implantar as políticas para o desmatamento zero e que esse dinheiro deve vir dos países ricos que produziram, em suas indústrias, a maior parte do carbono que se encontra na atmosfera.
Ninguém discorda dessa ladainha e o dinheiro da cooperação internacional tem, em quantidades que por óbvio devem ser aumentadas, abastecido o Fundo Amazônia sobretudo após os quatro anos de incompetência do governo que se foi em 2022.
Da mesma forma que cansou a equivocada e repetida justificativa sobre uma pobreza crônica do produtor rural na Amazônia, tema há muito superado pelos programas sociais, que se não desmatar para criar gado poderá até morrer de fome. Ninguém pode, atualmente, achar que isso é possível.
Observadores internacionais e o movimento ambientalista de modo geral externam descrença sobre a possiblidade de conquistas para as políticas internacionais sobre transição na geração de energia, de maneira a substituir o petróleo pela força do sol, do vento e da água.
Acreditam eles, que a poderosa, Petrobras incluída, indústria do petróleo e do gás vai reforçar sua atuação aproveitando que o país anfitrião, os Emirados Árabes Unidos, faz parte do seleto grupo dos dez maiores produtores de petróleo do mundo.
Nada mais compreensível e seria ingênuo imaginar que a redução da produção de petróleo pela OPEP apareça em algum documento oficial no final das negociações realizadas durante a COP 28.
Porém, tudo é bem diferente com relação à proteção das florestas.
Afinal, os países produtores de petróleo defendem o desmatamento zero da Amazônia o que faz da COP 28 um momento peculiar para os brasileiros.
Pouco se comentou na imprensa afinal os jornalistas, em sua grande maioria, são fiéis defensores dos oprimidos e mais fracos mesmo quando nada disso vem ao caso, entretanto colocar o agronegócio do lado oposto faz parte do estúpido jogo.
Por sinal, é bastante difícil entender direito de onde surgiu a rejeição, puramente ideológica e bastante insana, de um público que majoritariamente possui nível superior e acesso à informação, em relação ao reconhecido agronegócio nacional.
Parece, por assim dizer, uma ideia insuperável e que apesar de contrariar preceitos científicos sólidos continua a impregnar as universidades, sobretudo as públicas e mais ainda as federais, aquelas sob a tutela do Ministério da Educação.
Enquanto esse tipo de afirmação, deveras ultrapassada e erradíssima, circula entre os acadêmicos que devem estar se aposentando vá lá, o perigo surge quando esse tipo de prática universitária nefasta chega aos mais novos, ao Enem por exemplo.
Parece loucura que o último Enem, realizado para selecionar os novos ingressantes nas universidades públicas em 2023, em uma das 90 questões do primeiro dia, o claro engajamento ao ideário de partidos políticos tenha sido expresso assim:
No Cerrado, o conhecimento local está sendo cada vez mais subordinado à lógica do agronegócio. De um lado, o capital impõe os conhecimentos biotecnológicos, como mecanismo de universalização de práticas agrícolas e de novas tecnologias, e de outro, o modelo capitalista subordina homens e mulheres à lógica do mercado. Assim, as águas, as sementes, os minerais, as terras (bens comuns) tornam-se propriedade privada. Além do mais, há outros fatores negativos, como a mecanização pesada, a “pragatização” dos seres humanos e não humanos, a violência simbólica, a superexploração, as chuvas de veneno e a violência contra a pessoa…
Nada mais absurdo.
Desse conjunto de afirmações, sem o menor fundamento e que foi superado por estudos científicos robustos realizados nos últimos 50 anos, três merecem destaque.
A biotecnologia se refere à possibilidade de se extrair princípios ativos, em sua maior proporção das plantas, que são amplamente usados na medicina e alimentação responsáveis, dentre outros pontos importantes, por tornarem remédios e comida mais baratas e acessíveis aos mais necessitados.
A mecanização, não importando se leve ou pesada, possibilitou ao produtor rural, ao grande, mas ao pequeno também, trabalhar a terra com maior rapidez e menor esforço físico decorrente do uso exaustivo da enxada.
Os defensivos agrícolas, associados ao melhoramento genético, permitiram o ganho de produtividade que o agronegócio precisava para afastar os riscos da tragédia malthusiana em relação à inanição da humanidade.
Claro que ao fim e ao cabo o ativismo de partido político se resume a questionar o triunfo da propriedade privada e do capitalismo, mesmo sendo o sistema econômico adotado por 195 países associados à ONU.
Por isso mesmo, de nada adianta argumentar com amarras ideológicas, posto que são inexplicáveis e resistem à existência de quem as cultivam.
Em síntese não se trata da defesa do pequeno produtor e da condenação do agronegócio, é somente estupidez mesmo.
Faça um teste, troque a palavra agronegócio por hidrelétrica e Cerrado por Amazônia. Será que o Enem 2024 tem uma questão?
Difícil saber quanto do desmatamento ocorrido no período analisado pelo reconhecido Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Inpe, que vai de 01 de agosto de 2022 a 31 de julho de 2023, aconteceu em 2022 ou 2023, mas o que importa mesmo é a queda.
Em números relativos arredondados a boa nova é que a área de floresta destruída na série 2022/2023 foi 22% menor que o corte raso realizado no período anterior, entre 2021/2022.
Mesmo sendo um número absurdo de destruição florestal anual na Amazônia, a notícia é excelente na medida em que pode representar a inversão de uma tendência de alta iniciada ainda em 2013 e que deixou todos os países muito preocupados nos últimos quatro anos, de 2019 a 2022.
Explicando melhor.
Considerado um ano histórico, o ciclo de desmatamento aferido entre 2011/2012 foi o único, em mais de 35 anos de precisas medições realizadas pelo Inpe, em que se destruiu área inferior a 5.000 Km2 de florestas na Amazônia.
Retornar a essas taxas é urgente e um passo largo para os brasileiros honrarem o compromisso de zerar o desmatamento, assumido com os 198 países associados à ONU quando assinaram o Acordo de Paris, ainda em 2015.
Contudo, tanto a história quanto as estatísticas têm demonstrado que o retorno a 2012, para o tema do controle e redução do desmatamento na Amazônia é tarefa que exige competência quase sempre inexistente.
Por sinal, nunca é demais lembrar que os atuais 9.001 km2 destruídos de florestas ainda estão bem acima do período que antecedeu os últimos quatro desastrosos anos de um governo que não avançou em quase todos os ministérios, muito menos para controlar o desmatamento na Amazônia.
Naquela época, entre 2015 e 2018, os brasileiros desmataram em torno de 7.000 Km2 por período analisado, quando o crescimento em relação ao histórico ano de 2012 preocupava as lideranças políticas com mandato para administrar a crise decorrente da destruição florestal no país.
A repercussão da queda e não propriamente da área em números absolutos de floresta que virou capim, colocará o Brasil em evidência e muito bem na foto durante a COP 28 que se inicia em dezembro próximo nos Emirados Árabes Unidos.
Afinal, a expectativa a partir de agora é que o desmatamento na Amazônia seja reconhecido, pelos fundos de capitais e dirigentes estatais, como fator chave de decisão de investimento em economia de baixo carbono na região e no país.
Após concluir a aprovação das normas para o funcionamento do mercado regulado de carbono e com o aquecimento do mercado voluntário, o momento é ideal para os brasileiros se posicionarem como referência mundial para um desenvolvimento menos intensivo em petróleo e combustíveis fósseis.
Retornar ao histórico ano de 2012 é o caminho para o desmatamento zero da Amazônia e não há plano b.
Embora se reconheça a dificuldade do governo para selecionar e contratar profissionais experientes em projetos de desenvolvimento para o Acre, os líderes políticos do Projeto Florestania não demonstraram estatura para compreender e, o melhor, tentar vencer a empreitada.
Segundo a teoria do Triangulo de Governo, elaborada pelo economista chileno Carlos Matus na década de 1970, os gestores e técnicos compõem a Capacidade de Governo que em conjunto com o Projeto de Governo e a Governabilidade formam o tripé de sustentação de um mandato.
No caso do fracasso do Projeto Florestania, analisado aqui e em outros artigos semelhantes publicados nesse espaço, a reduzida quantidade e qualificação dos gestores e equipe técnica comprometeu a Capacidade de Governo direcionada para criar as condições propícias ao progresso econômico.
Resumindo, o complexo desafio da transformação produtiva em direção ao aproveitamento do potencial representado pela biodiversidade florestal se mostrou grande demais para o número e a experiência acumulada pelos especialistas disponíveis na estrutura de governo.
Como afirmam os produtores criar boi é fácil, agora manejar a floresta é muito complicado.
Aqueles que estão familiarizados com a realidade rural amazônica e sobretudo no Acre devem concordar que tirar a produção rural de mais de 40 anos de atraso tecnológico com a criação de boi e plantio de arroz, feijão, milho e macaxeira, não é tarefa das mais simples.
Empreitada, contudo, piorada em demasia quando a alternativa ao primitivo modelo de corte-e-queima, única diga-se, reside na exploração de um rol de produtos que existem na biodiversidade, mas que, devido a muitas razões, apresentam uma insuperável falha de mercado.
Ao mesmo tempo em que possui reconhecido valor econômico estratégico, para o futuro, a biodiversidade florestal não consegue ser comercializada com preço atrativo hoje, no presente.
Alguns produtos mais outros menos, porém a falha de mercado é uma realidade que persiste desde o final do século passado e somente poderá ser superada com ajuda incondicional e permanente de uma política pública que resista ao tempo. Pelos próximos 20 anos, por exemplo.
Para contextualizar pode-se afirmar que em uma métrica de sustentabilidade as diversas alternativas produtivas para ocupação do solo no Acre variam do menor nível e elevado risco ecológico, representado pelo desmatamento para plantio de capim, até o de maior sustentabilidade e risco zero representado pela Estação Ecológica do rio Acre, onde é proibido mexer na floresta.
Em outras palavras, assumindo que não há menor chance de convivência dos dois modelos funcionar em um solo com e sem desmatamento ao mesmo tempo, a economia no setor primário acreano se concentra em dois grandes grupos: exploração técnica e comercial da biodiversidade florestal versus destruição da biodiversidade florestal.
Dominar, compreender e concordar com essa máxima deveria ser uma condição para os especialistas entrarem na equipe responsável pela execução do Projeto Florestania. Mas, infelizmente, não foi nada disso.
Lançando mão do exemplo mais evidente e de simples constatação, tanto a política florestal iniciada em 2001 quanto o Sistema Estadual de Áreas Naturais Protegidas, considerados pilares para a saída econômica pela floresta, requeriam gestores com perfil para conseguir ampliar a pequena participação da biodiversidade florestal no PIB acreano.
Finalmente, experiências de gestão pública bem-sucedidas demonstram que a competência para gerenciar e o domínio de especialidades em áreas prioritárias ao Projeto de Governo, são condições essenciais para evitar o colapso.
Mesmo que num primeiro momento o Projeto Florestania reuniu uma equipe promissora, os resultados mostram que no andar da carroça o profissional ou gestor ideal cedeu o lugar para o assessor pessoal.
Sempre fiel e muito preocupado com a próxima eleição o assessor resguardava o futuro do político, sem se importar com o futuro do Projeto Florestania.
Mas isso é outro artigo.
Desde o século passado o Banco da Amazônia, apesar de entregar para a pecuária extensiva a maior quantia do Fundo Constitucional do Norte destinada ao crédito rural, repete propaganda enganosa afirmando apoiar a sustentabilidade da região.
A propaganda é enganosa posto que ninguém pode negar, após uma série robusta de medições e estatísticas realizadas com rigor científico pelo Inpe desde 1988, que a pecuária extensiva é a principal responsável pelo desmatamento da Amazônia.
Por óbvio, fornecer crédito para a pecuária extensiva é exatamente o mesmo que financiar o aumento anual do corte raso de florestas para liberar espaço, ou terra, para plantios de capim na Amazônia.
Resumindo, os financiamentos aprovados pelo Basa para pecuária extensiva degradam a vida na Amazônia uma vez que desmatamento, seja legalizado ou não, jamais trará sustentabilidade econômica, social e ecológica para a região.
Restaria ainda o argumento, igualmente fútil diga-se, de que o financiamento para pecuária extensiva foi importante em um momento de transição, quando o crédito para o extrativismo, razão da criação do Banco da Borracha que antecedeu ao Basa, se esgotou com a derrocada da produção de borracha de seringal nativo, substituída pela borracha cultivada em São Paulo.
Entretanto isso é coisa do século passado e, por suposto, não precisa continuar assim. Há movimentações de mercado e de política pública para tornar a restauração florestal um atrativo para investimentos estatal e, em especial, do setor privado.
Não à toa a ONU proclamou a década que começou em 2021 como “Década da Restauração de Ecossistemas”, com meta quantitativa de restaurar um bilhão de hectares de ecossistemas nativos em todo o mundo até 2030 conforme deliberado no Acordo de Paris (veja mais aqui: Associação Andiroba).
Ainda em 2017 foi publicado o Decreto 8.972 que instituiu o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa – Planaveg, com meta comprometida de restaurar 12 milhões de hectares (veja mais aqui: Associação Andiroba).
Discutir a oferta de financiamento para reflorestamento e restauração florestal, em um país com demanda para mais de 70 milhões de hectares foi o que motivou o encontro de mais de 90 agentes estatais e investidores mobilizados pelo RESET CONECT (veja mais aqui: Reset | Informação para quem transforma (uol.com.br).
Não se trata de demanda de organizações não governamentais e ambientalistas, como foi no século passado, reflorestar e restaurar a mata-ciliar de rios amazônicos ganhou relevância e atrairá investimento em todo planeta.
Para não ser ultrapassado, o Basa deve rever, hoje, a quantia que deslocará da pecuária extensiva para restaurar a mata-ciliar e a sustentabilidade da Amazônia.
Há um pequeno percalço para que os brasileiros retomem durante a COP 28, Conferencia das Partes para a Convenção de Mudanças Climáticas assinada na Rio 92 e que se inicia dia 30 de novembro de 2023 nos Emirados Árabes, a posição de liderança para política ambiental internacional na ONU: a divulgação da área desmatada na Amazônia.
Todos que acompanham a política internacional de meio ambiente reconhecem o protagonismo da diplomacia brasileira nas discussões sobre o aquecimento do planeta e, talvez sem exceção, os países esperam pelo desmatamento zero da Amazônia.
Divulgada com disciplina exemplar pelo conceituado Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais, o Inpe, sempre no mês de novembro de cada ano, a taxa de desmatamento da Amazônia, contabilizada para o período de agosto de 2022 a julho de 2023, demonstrará o compromisso e a determinação do atual governo federal para zerar a destruição florestal da região.
Ao abarcar cinco meses (de agosto de dezembro) de medição durante o governo anterior, que foi notório pela incompetência para controlar o desmatamento, e sete meses (de janeiro a julho) do atual, que assumiu compromisso em priorizar a política ambiental durante a campanha eleitoral, a área de floresta destruída em 2023 na Amazônia será aguardada com elevada expectativa na COP 28.
Mas, até o momento os brasileiros fizeram o dever de casa. O plano de controle do desmatamento (conhecido pelo acrônimo PPCDAM) foi repaginado e relançado em junho com mais de 200 metas que devem consumir quase 100% capacidade operacional do Ministério do Meio Ambiente, MMA.
Todavia, o MMA concentrará parte considerável das ações para controlar e zerar o desmatamento na Amazônia somente se os gestores atuais não perderem tempo com as distrações sobre exploração de petróleo, rotulagem de transgênicos, biopirataria e outras tolices.
Em outra frente promissora a aprovação pelos senadores e talvez a tempo de apresentar na COP 28 pelos deputados federais, da legislação sobre o mercado regulado de carbono fornecerá ao setor privado a relevância necessária para o alcance da meta de desmatamento zero na Amazônia.
Ocorre que após a assinatura do Acordo de Paris, ainda em 2015, os avanços para uma economia planetária de baixo carbono sofreu forte revés em decorrência da busca desenfreada pelas vacinas para conter a emergência sanitária da pandemia.
Porém, assim que os países iniciaram sua recuperação, ainda no final de 2021, o Pacto Ambiental de Glasgow, assinado na Escócia, retomou o rumo para consolidar um mercado internacional de carbono a ser regulado pela própria ONU (acesse: http://www.andiroba.org.br/artigos/?post_id=5160&artigos_ano=2021).
Por óbvio o momento em nada se compara com os quatro anos desperdiçados pelo governo federal que se despediu em 2022. Agora é hora de uma discussão detalhada e objetiva sobre o futuro.
Resumindo, alcançar o desmatamento zero da Amazônia antes de 2030 deveria ser encarada como estratégia de política externa para o Brasil.
Difícil entender as razões que fazem com que determinados temas entrem para a agenda política de uma região e passe a mobilizar seus representantes eleitos para o parlamento estadual e federal, mas com certeza o mercado de carbono na Amazônia ainda não faz parte dessa agenda.
Após aprovação pelos senadores o projeto de lei que institui o denominado mercado regulado de carbono no país está sendo analisado pelos deputados federais sem que nenhum parlamentar, dos nove estados amazônicos, priorize o tema.
Aqui cabe um adendo. A Câmara dos Deputados tem demonstrado, nos últimos dois anos, uma agilidade e eficiência bem superior na aprovação de assuntos polêmicos e urgentes quando comparada com a letargia e, às vezes, omissão demonstradas pelo Senado.
Sendo assim, contando com o desempenho já demonstrado pelos deputados federais, tudo indica que em breve contaremos com uma legislação que forneça segurança jurídica aos investidores no auspicioso mercado de carbono.
Os poucos que estão lendo esse artigo devem questionar que o mercado de carbono é importante para o país e não somente para a Amazônia, o que é correto.
Contudo, nenhum dos outros cinco biomas nacionais (Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pantanal e Pampas), possuem a quantidade de carbono estocado em biomassa como a Amazônia, talvez mesmo que somados.
Acontece que além do valor em estoque da matéria-prima conhecida por biomassa florestal há outro ponto importante para a bancada de políticos amazônicos considerarem.
Existem evidências científicas robustas que colocam o mercado de carbono como um dos mais importantes, senão o principal, mecanismos para alcançar, no curto prazo, o desmatamento zero da Amazônia.
Por curto prazo entenda-se antes de 2030, o ano limite assumido pelos brasileiros quando se comprometeram com as metas sobre desmatamento da Amazônia definidas para o Acordo de Paris, ainda em 2015.
O fato é que a partir do mercado de carbono a Amazônia pode adquirir atratividade econômica nos moldes do ciclo da seringueira, Hevea Brasiliensis, árvore que dominou o mundo ao substituir a exportação de caucho, seiva semelhante ao látex mas que dependia da derrubada da árvore para sua extração, ao se tornar produto imprescindível para a poderosa indústria do automóvel.
Contudo e infelizmente ao se distanciar da agenda política após a segunda guerra, desde a década de 1990 a produção amazônica de borracha foi superada pelos cultivos homogêneos do sudeste do país, em especial dos produtores paulistas.
A conclusão é que em 2023 a borracha do seringal nativo da Amazônia é extraída em escala insignificante, com estatísticas difíceis de mensurar, produtividade irrisória e em poucos locais onde a importância eleitoral é maior que a econômica.
O mercado de carbono não pode seguir pelo caminho da borracha. Se não for prioridade para os políticos da Amazônia será para os do sudeste do país.
Capacidade de Governo é um dos vértices do Triangulo de Governo, que somado ao Projeto de Governo e à Governabilidade formam o tripé de sustentação de uma administração por um ou mais mandatos.
Para o economista chileno Carlos Matus, mentor da teoria do Triangulo de Governo na década de 1970, quando o tripé funciona o Presidente, Governador ou Prefeito terá sucesso, quando não, fracasso.
A experiência única do Projeto Florestania, vivenciada durante 20 anos pelos acreanos, a despeito de seu estudo ter sido até hoje negligenciado pelos historiadores e cientistas políticos, representa excelente fonte de análise ao mostrar com clareza o momento inicial, do sucesso em 1998, e o final, do fracasso em 2018.
Melhor ainda, pesquisar os detalhes dos últimos 25 anos da história política do Acre, tendo por referência a teoria do Triangulo de Governo, ajudará a entender as causas para que o período de grande otimismo, observado sobretudo no início da década de 2000, desse lugar ao desmedido pessimismo após 2008.
Ocorre que diante da subjetividade e generalização assumida no Projeto Florestania, caberia à equipe técnica que foi incorporada ao conjunto do funcionalismo público por meio de nomeações para cargos de gerenciamento, conduzir o desafio de viabilizar o Florestania.
Contudo, a experiência mostrou que a operacionalização do Florestania não dependia somente da capacidade dos técnicos que atuavam nos órgãos públicos.
Sua complexidade exigia suporte incondicional dos líderes políticos, de maneira a adequar a expectativa que cada ator social e agente econômico cultivava em relação ao rumo do Florestania.
Explicando melhor. Tendo em vista que todo território acreano no primórdio da ocupação econômica se encontrava 100% coberto por floresta, não precisa pensar muito para entender que defender a pecuária extensiva, ou qualquer outra opção inserida no agronegócio, também significa aceitar o desmatamento.
Como todos estão cansados de saber, não há meias palavras, almoço grátis ou criação de boi solto no pasto no Acre sem destruição da biodiversidade florestal.
Assim, em que pese a omissão do Projeto Florestania em decidir por um ou outro caminho, posto que, como afirmado antes, os líderes políticos adotaram por regra abraçar o desenvolvimento pela floresta sem, contudo, desapontar os pecuaristas, a Capacidade de Governo pendeu para um e outro lado, conforme o pensamento majoritário em cada instituição e de cada gestor.
À deriva, sem orientação política superior os gestores e a equipe técnica executavam tarefas sob demanda e com rumo desconhecido.
Entretanto havia uma realidade objetiva, como gostam os sociólogos, que os envolvidos no Florestania, de maneira discreta ou às claras sabiam ser crucial.
Afinal existe considerável consenso científico de que a exploração da biodiversidade florestal superaria a estagnação econômica trazida pela pecuária extensiva e que se arrastava desde a década de 1960 até o novo século, pós ano 2000.
Em síntese, ninguém poderia negar que foi a biodiversidade florestal, uma vocação produtiva natural do Acre, que deu origem ao Projeto Florestania e não a necessidade de se fazer o contraponto ao agronegócio de baixa produtividade da pecuária extensiva, à época desacreditado.
Por óbvio, a condução de um processo técnico e político dessa magnitude e complexidade, demandaria contratar profissionais com qualificação e experiência para conduzir a transição de uma economia baseada no boi solto no pasto, estagnada há mais de 30 anos, para uma nova economia ancorada na biodiversidade florestal.
Todo profissional envolvido com setor produtivo entende as dificuldades para selecionar, treinar e fazer funcionar uma equipe de profissionais com especializações diversas em uma indústria, num supermercado e até mesmo numa padaria.
Agora imagine conseguir reunir vários peritos, alguns estreantes no serviço público com o propósito de, num período de quatro anos, consolidar uma Capacidade de Governo para atender cobranças imediatas por educação e saúde, enquanto colocavam em pratica as demandas novas, inventadas pelo Projeto Florestania.
Mas isso é outro artigo.
Existe uma dificuldade crônica para a imensa maioria dos brasileiros compreenderem a importância da separação dos três poderes republicanos e mais ainda para delimitar a função a ser desempenhada pelo Poder Judiciário e o Poder Legislativo.
Além de contaminar as opiniões de representantes de alto nível a separação dos poderes, ponto sensível ao processo democrático, retrocede sempre que, por exemplo, juízes impõem por normas legais ao que deveria ser discutido e aprovado pelos políticos. Exemplos não faltam.
Jornalistas de quase todas as empresas de mídia do país aplaudiram quando o Supremo Tribunal Federal, STF, preencheu a lacuna deixada pelo Congresso Nacional e recusou a tese do Marco Temporal para regularização fundiária de terras para os índios.
Uma discussão muito complexa e que poucos na imprensa conseguem entender. Não à toa, as notícias priorizaram a separação dos ministros do STF e, por tabela, de todas as pessoas que conseguem opinar sobre o assunto em contrários ou favoráveis aos próprios indígenas.
O que é, no mínimo, deplorável.
Por óbvio, um raciocínio simplório dos jornalistas, que foi republicado sem cerimônia e que se inicia com a afirmação, sem qualquer evidência, de uma suposta demanda do agronegócio, sempre tratado com preconceito incompreensível para um setor que representa quase 50% da economia do país, e que se encerra com o fim definitivo da demarcação de Terras Indígenas.
Nada disso é verdade ou tudo não passa de um grande equívoco e, justamente por isso, o STF não deveria se adiantar ao Poder Legislativo.
Não fosse a letargia dos senadores e não somente o Marco Temporal mas temas polêmicos como a exploração mineral e o arrendamento pelo agronegócio de Terras Indígenas estaria regulamentado de acordo com legislação aprovada pela Câmara dos Deputados, já faz um bom tempo.
O que está em jogo e ao mesmo tempo faz com que os parlamentares em Brasília sejam os principais e únicos responsáveis por uma regulamentação conclusiva é o modo como tratamos até hoje as Terras Indígenas e as populações que vivem lá.
A legislação já aprovada pelos deputados e que deve ser reforçada pelos senadores altera de maneira sensível as diretrizes propugnadas pela Funai e por parte expressiva de acadêmicos, em especial em universidades federais.
E, convenhamos, se de um lado os brasileiros são sensíveis à causa indígena e defensores da destinação de terras para sua sobrevivência, ninguém pode ser favorável a insegurança jurídica que impede o aporte de capital privado que, no curtíssimo prazo, deve melhorar o IDH das próprias populações indígenas.
Difícil entender as razões para que grupos políticos aplaudam a intervenção do STF. Alegam que vão perder no debate e na votação a ser travada no Congresso Nacional. Esquecem que, afinal, o nome desse embate é política, a arena onde o país consolida sua democracia.
Não foi diferente quando o Congresso Nacional impediu a transferência da Funai do Ministério da Justiça para um ministério que não terá vida longa. Os mesmos políticos, com apoio dos jornalistas, reagiram como uma afronta, ou um golpe, como gostam de repetir.
Mas, a Funai está no seu devido lugar institucional, vinculada ao Ministério da Justiça e foi a política, não os juízes, que conseguiu o melhor para o país.