Por muito pouco o desmatamento na Amazônia computado pelo infalível Instituto Nacional de Pesquisa Espacial, Inpe, em 5.796 km² para o período entre primeiro de agosto de 2024 a 31 de julho de 2025 não estabelece uma nova taxa mínima.
Desde 2012, único ano em que se desmatou uma área inferior a 5.000 km2 na Amazônia, que o governo federal tenta, sem sucesso, manter a quantidade de floresta destruída anualmente dentro dessa margem.
Dessa vez chegou perto e o resultado divulgado pelo Inpe às vésperas da COP30 em Belém foi recebido com festa e, claro, colocou o Brasil no holofote internacional ao demonstrar que é possível, com fiscalização, controlar e até chegar ao desmatamento zero na Amazônia.
Contudo e infelizmente, a exploração de petróleo no mundo e sobretudo na parte brasileira da margem equatorial, novamente infelizmente, com forte apoio dos diplomatas e políticos colombianos ganhou maior espaço nas discussões e na tentativa de se propor uma agenda de redução do uso de combustível fóssil em todo planeta.
Um desperdício de tempo, posto que a redução do uso de petróleo não deverá ser obrigatório por uma decisão de conferências da ONU, uma vez está na ponta do consumo a chave para reduzir a produção.
Há um debate, interminável diga-se, acerca das prioridades em relação aos impactos do aquecimento do planeta e os defensores da adaptação demonstraram bem mais argumentos que aqueles que insistem na prioridade da transição.
Para quem, como esse articulista, tem dificuldade de diferenciar as rotas de superação da crise ecológica, por adaptação entende-se o investimento de muito dinheiro para que os países mais afetados pelo aumento da temperatura e, em especial, pelo aumento do nível das marés, como as ilhas do oceano pacífico, consigam se adaptar a um mundo mais quente e alcançar melhor nível de desenvolvimento humano.
Pelo lado da transição estão os apocalípticos que acreditam no fim do planeta em algum momento no médio prazo se o sistema econômico mundial não for alterado, esquecendo-se que, como afirmou o filósofo, que é mais fácil o planeta acabar que o capitalismo ter fim.
A cada hidrelétrica construída se reduz a dependência do petróleo para gerar energia elétrica, da mesma forma que a cada carro elétrico colocado no mercado menos gasolina será comprada e assim por diante.
Será dessa maneira que o preço do petróleo cairá e a produção seguirá o mesmo caminho, contudo, sem tirar ou secar o dinheiro do petróleo que abastece o dreno de recursos financeiros destinados para a adaptação dos países mais afetados pelo calor que está vindo.
Não por acaso o desmatamento zero da Amazônia é ponto central para reduzir o consumo de petróleo uma vez que a substituição das florestas por cultivos e em bem maior proporção pelo boi solto no pasto promove o mercado do óleo combustível.
Foi um sucesso a redução do desmatamento na Amazônia em 2025 e pelo quarto ano consecutivo, o que pode, se tudo der certo e os gestores ambientais do governo federal não se distraírem com petróleo, configurar uma tendencia que colocará a taxa de desmatamento dentro da margem do histórico ano de 2012.
Foi um sucesso a COP30 e o governo federal reforçou a liderança brasileira para a política internacional de meio ambiente.
Estão, por óbvio, o governo do Pará e a Prefeitura de Belém de parabéns.
Todo economista de tendência comunista, socialista ou liberal reconhece que a sociedade estará disposta a baixar a régua da sustentabilidade ambiental na medida em que o ganho econômico, ou a riqueza gerada, seja compatível com os custos de recuperação da perda de sustentabilidade.
Traduzindo, em um exemplo rápido, seria mais ou menos o que o povo do Acre aceitou pelo voto, quando trocou o Projeto Florestania pelo Projeto Agronegócio, ainda no decorrer da segunda década desse século, como modelo econômico ideal para o Acre melhorar o IDH e ampliar seu Produto Interno Bruto.
Naquele momento, a despeito de nunca ter sido de fato indagado, a resposta dos acreanos foi concordar em enfrentar os efeitos nefastos das taxas anuais de desmatamento e das queimadas, em razão dos benefícios econômicos trazidos pela pecuária extensiva.
Por óbvio, em nenhum momento os projetos para o futuro do Acre foram julgados ou discutidos com a devida responsabilidade e clareza, quer seja por algum partido político, candidato a governador ou ao parlamento, ou liderança política com ou sem mandato, nunca em qualquer momento.
Entretanto, independente de haver ou não alguma discussão, a pecuária extensiva predomina em toda extensão rural do território acreano, da beira dos rios à margem das rodovias, com uma tendência de crescimento que impressiona, em especial após o boom da pecuária extensiva ocorrido em 2007.
Ou, melhor ainda, jamais se discutiu que a perda de sustentabilidade ecológica no desenvolvimento estadual, decorrente de cada hectare de floresta destruída, poderia ser compensada usando o dinheiro da arrecadação de impostos trazida pelo gado na restauração florestal da mata ciliar do Rio Acre, por exemplo.
Contudo, em uma conclusão simplista, mas não simplória, pode-se arguir que desde que uma perda em sustentabilidade ecológica equivalente a 500 hectares de floresta por ano, poderia, em contrapartida, ser compensada com a destinação compulsória e também anual de 20 milhões de reais em restauração florestal.
Resumindo, a perda em sustentabilidade ecológica devido ao desmatamento deveria ser equilibrada em igual medida com o investimento em restauração florestal e o consequente ganho de sustentabilidade ecológica.
Porém e infelizmente, além de não ser clara, explicita e quantificada a perda em sustentabilidade, não há garantia alguma de que o lucro da pecuária extensiva poderá, um dia, ser revertido para a sociedade na restauração de mata ciliar.
Ou seja, todo esse raciocínio, ainda se resume atualmente a um devaneio solitário do autor, todavia nem sempre foi assim.
Em poucos momentos durante a história do Acre, existiu oportunidade para discutir os benefícios do crescimento econômico proporcionado pelo agronegócio da pecuária extensiva em relação aos custos devidos à perda de sustentabilidade ambiental pelo indispensável desmatamento.
Um desses momentos aconteceu nos idos da década de 1980 do século passado, quando as primeiras Reservas Extrativistas do país foram inventadas e criadas no Acre.
Naquela época, ficou claro aos envolvidos com o experimento das Reservas Extrativistas, que o modelo de desenvolvimento baseado na biodiversidade florestal embora encantasse o mundo requeria investimento elevado e permanente quase impossível de acontecer.
Agora, na COP30 que vai acontecer em Belém do Pará em novembro, haverá outro desses momentos, para os acreanos resgatarem os ideais da década de 1980.
Importantes autores discutiram o processo de ocupação produtiva do país fornecendo especial destaque à dificuldade do colonizador português para conseguir superar os desafios impostos pelo ecossistema florestal da Amazônia.
Dentre aqueles que mais avançaram nesse debate, Caio Prado Júnior e Sérgio Buarque de Holanda conseguiram esmiuçar de maneira excepcional o eterno dilema na definição de um modelo apropriado de ocupação do meio rural amazônico.
Com sensível capacidade de observação delimitaram, com inegável precisão, a impraticável aplicação conjunta da estratégia de desenvolvimento baseada na pecuária extensiva e na exploração sustentável da biodiversidade florestal.
Embora hoje pareça óbvio que na mesma área de terra de onde se extrai o látex da seringueira não é possível cultivar o capim, posto que o plantio dependa do solo desnudo e a indispensável retirada das árvores que fornecem a borracha no seringal nativo, naquela época distinguir entre um e outro modelo não era tarefa fácil.
Não à toa o embate entre a participação da pecuária extensiva versus biodiversidade florestal na composição do PIB regional tem sido absurdamente vencido pela criação de boi, desde as vitórias da biodiversidade florestal representadas pelo ciclo econômico da borracha encerrado em 1911.
Falando de outra maneira, o embate desmatamento versus conservação da floresta tem sido vencido de modo assustador pelo primeiro, sempre realizado conforme previsto na legislação e, o mais grave, com apoio indispensável de mais de 90% do montante destinado ao crédito rural, liberado pelo Basa na Amazônia.
Como bem antecipou Caio Prado Júnior, somente por meio do estudo minucioso da história da formação social e econômica brasileira, será possível o estabelecimento de políticas de macroeconomia com maiores chances de acerto.
Aliás, numa de suas principais obras, História do Desenvolvimento, o autor realizou uma retrospectiva da ocupação social e econômica do Brasil, desde a colonização portuguesa até o processo de industrialização, ressaltando as características da aventura colonizadora portuguesa.
Com relação à Amazônia o diagnóstico não poderia ser mais atual e determinístico, vejam:
No vale amazônico os gêneros de atividade se resumem praticamente a dois: penetrar a floresta ou os rios para colher os produtos ou capturar o peixe; e conduzir as embarcações que fazem todo o transporte e constituem o único meio de locomoção. Para ambos estava o indígena admiravelmente preparado. A colheita, a caça, a pesca, já são seus recursos antes da vinda do branco: como pescador, sobretudo, suas qualidades são notáveis, e os colonos só tiveram neste terreno que aprender com eles. (Prado Júnior, 2.000, p70).
Em complementação, as características peculiares dos colonos portugueses que dependiam dos indígenas para compreender a complexidade presente na biodiversidade florestal da Amazônia, são detalhadas com maestria na célebre obra Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda.
O gosto por recompensas e prêmios individuais por demonstração de coragem é outra peculiar característica da sociedade portuguesa à época da colonização, afirma o autor. Contudo, continua, se tais características não moldam exatamente uma índole moral ideal, o fato é que distinguiram os portugueses como admiráveis conquistadores.
Como “pioneiros da conquista do trópico para civilização, tiveram os portugueses, nessa proeza, sua maior missão histórica. E sem embargo de tudo quanto se possa alegar contra sua obra, forçoso é reconhecer que foram não somente os portadores efetivos como os portadores naturais desta missão” (Buarque de Holanda, 1995, p43).
A bem da verdade, a “exploração dos trópicos não se processou por empreendimento metódico e racional, não emanou de uma vontade construtora e enérgica: fez-se antes com desleixo e certo abandono. Dir-se-ia mesmo que se fez apesar de seus autores. E o reconhecimento deste fato não constitui menoscabo à grandeza do esforço português” (Buarque de Holanda, 1995).
Não obstante, quando houve necessidade, os portugueses, a seu modo, se prenderam à terra para torná-la produtiva. De fato, a tarefa da colonização exigiu dos portugueses – mais que apreço por aventuras – adaptação às atividades de produção.
E, finalizando, no momento em que foi necessário se adaptar às complexidades do ecossistema amazônico para moldar uma produção florestal na dimensão da riqueza gerada durante o ciclo econômico da borracha, Sérgio Buarque presta sua reverencia à contribuição inigualável dos jesuítas, vejam:
Foram ainda os jesuítas que representaram, melhor de que ninguém, esse princípio da disciplina pela obediência. Mesmo em nossa América do Sul, deixaram disso exemplo memorável com suas reduções e doutrinas. Nenhuma tirania moderna, nenhum teórico da ditadura do proletariado ou do Estado totalitário, chegou sequer a vislumbrar a possibilidade desse prodígio de racionalização que conseguiram os padres da Companhia de Jesus em suas missões. (Buarque de Holanda, 2001, p39).
Não havia e não há alternativa, o desmatamento zero deve acontecer de imediato e a saída para o desenvolvimento é pela floresta.
Embora o foco dos debates na COP30, a conferência da ONU que está acontecendo em Belém, capital do Pará, deve permanecer no alcance da meta inescapável do desmatamento zero da Amazônia, o pano de fundo do debate será as estratégias de desenvolvimento até então adotadas na região.
Após a riqueza, jamais repetida diga-se, obtida até 1911 com a extração de látex e exportação de borracha para abastecer a indústria automobilística internacional, a região foi, em especial após a segunda guerra mundial, submetida a um conjunto de experimentos voltados para reativação de sua estagnada economia.
Enquanto um processo de industrialização forçada e que, por sinal, tem data para terminar moldava o meio urbano com a Zona Franca de Manaus, projeto que a despeito das críticas foi bem sucedido ao proporcionar a estruturação de uma metrópole moderna com uma população de mais de dois milhões de habitantes, no meio rural a pecuária extensiva se consolidou.
Outras capitais e algumas metrópoles passaram por processo semelhante com o modelo Zona Franca ou Zona de Exportação, se multiplicando na área urbana, sem, contudo trazer a esperada industrialização.
De outra banda, no setor primário da economia a pecuária extensiva se tornou hegemônica estando presente em mais de 80% das propriedades rurais e, ao mesmo tempo, sendo responsável por mais de 90% do desmatamento legalizado, e também o ilegal, que ocorrem todos os anos.
Alterar a dinâmica estabelecida pelo ciclo econômico da pecuária extensiva é, por óbvio, o maior desafio a ser superado na região se o desmatamento, novamente legal e ilegal, zero for a meta prioritária a ser alcançada.
De maneira resumida, significaria criar condições para que o produtor rural consiga auferir a mesma renda que obtém com a criação do boi solto no pasto praticando outra atividade produtiva que mantenha a floresta no solo onde seria cultivado o capim.
Deixando de lado o preconceito com a madeira, atualmente o produto de maior valor agregado existente na biodiversidade florestal da Amazônia, seria necessário implantar uma lista de projetos separados em dois grandes grupos: plantio consorciado de árvores e culturas anuais em Sistemas Agroflorestais e o manejo florestal técnico da floresta nativa.
Somente assim, a vantagem competitiva do ecossistema natural da região poderia ser superior e prevalecer ao desmatamento para cultivo de capim, quando uma única espécie substitui a biodiversidade nativa.
Entretanto, no outro lado da equação, o estabelecimento de vantagens competitivas por meio de um cluster do ecossistema nativo da Amazônia, pressupõe a existência dum capital humano bem diferente do atual, que consiga dominar as técnicas de extração comercial e sustentável dos produtos explorados nesse mesmo ecossistema florestal nativo.
Finalmente, a complexidade da biodiversidade florestal presente no ecossistema da Amazônia impõe um modelo diferenciado de exploração, que deve se voltar para a potencialização da diversidade em si mesma, de modo a fazer aumentar a biodiversidade ao invés de priorizar a produtividade isolada de uma ou outra árvore ou espécie florestal que em determinado momento adquire maior valor comercial.
Seringueira, açaí, pimenta longa, cacau e palmito são exemplos de espécies nativas da Amazônia que alcançaram valor comercial expressivo, foram domesticadas e levadas para serem cultivadas em outros lugares onde suas pragas ainda não existem.
Concluindo, na COP30 o esforço deve se concentrar nas possibilidades que a Amazônia possui para superar o decepcionante ciclo econômico da pecuária extensiva.
Não faltaram críticas à COP29 de 2024, realizada em Baku, no Azerbaijão, e para a COP28 de 2023, realizada em Dubai, nos Emirados Árabes, por priorizarem a discussão sobre a continuidade do uso do petróleo no planeta.
Ativistas alegavam que os países associados à Organização dos Países Produtores e Exportadores de Petróleo, a poderosa OPEP, jamais deixariam que fossem aprovadas deliberações que reduzissem o uso do mais importante combustível fóssil para a humanidade.
Estavam em grande medida errados, as duas COP’s anteriores apresentaram avanços importantíssimos sendo que pela primeira vez se colocou o guiso no pescoço do gato, como no adágio popular.
A despeito de contrários ou não, as deliberações finais deixaram clara a determinação dos países em priorizar fontes consideradas limpas, em especial para gerar energia elétrica por meio das águas, do sol, do vento e da queima de biomassa e de lixo em caldeiras.
Por óbvio exageraram, mas o importante agora é que a COP30 precisa ser elevada pelos jornalistas e o público brasileiro em geral ao topo de uma oportunidade única para o país se dedicar a compreender e encontrar soluções para a maior floresta tropical do mundo: a Amazônia.
Para tanto, em um primeiro momento, seria oportuno construir sete consensos sobre desmatamento que, uma fartura e variedade impressionante de estudos e estatísticas, mostram ser primordiais:
1 – O desmatamento, legalizado e ilegal, é o maior problema econômico, social e ecológico da Amazônia.
2 – O desmatamento na Amazônia também é o principal obstáculo para o Brasil honrar os compromissos assumidos na assinatura do Acordo de Paris, em 2015.
3 – O desmatamento realizado dentro da legislação precisa ser zerado da mesma maneira que o desmatamento ilegal.
4 – O desmatamento é causado, em mais de 90% das vezes, pela criação de boi solto no pasto, sobretudo na mata-ciliar de rios e margem de rodovias.
5 – O desmatamento disponibiliza para a pecuária extensiva a área de floresta anual necessária para sua expansão e consolidação.
6 – O desmatamento tem os custos cobertos pelo crédito rural oferecido pelo Basa por meio do FNO e Pronaf.
7 – O desmatamento pode ser zerado se o crédito rural para ampliação ou manutenção da pecuária extensiva na Amazônia for, igualmente, zerado.
Não conseguiremos um complexo acordo social sobre os sete consensos acima, até hoje por sinal considerado impossível, se distraindo com uma pauta em resposta à gritaria sobre a exploração de petróleo na margem equatorial.
Por sinal, com os poços localizados há mais de 500 quilômetros e bem longe da foz do Rio Amazonas a decisão pela exploração de petróleo ali foi tomada bem antes, quando os ingleses fizeram as primeiras perfurações em uma área idêntica, com a mesma característica geológica no mar das Guianas.
Demonstrando determinação pelo desmatamento zero, todo país associado à ONU poderá contribuir no financiamento da fiscalização para zerar o desmatamento ilegal e na oferta de alternativas produtivas baseadas na saída pela floresta para zerar o desmatamento legalizado para a pecuária extensiva.
Pessoal, não se distraiam com licenciamento ambiental, petróleo, lixo, hotel, transporte, homofobia, racismo…, o foco é o desmatamento zero!
Nas inteligentes palavras do economista Denis Minev, enviado especial para o setor privado da Amazônia na COP30, a região esbanja em empreendedorismo que não consegue avançar como deveria, pois os incentivos são direcionados para atividades de baixa produtividade, como a pecuária extensiva, por exemplo.
Reforçando a análise realizada pelo excelente estudo publicado pelo Banco Mundial em 2023, com o instigante título “Equilíbrio Delicado para a Amazônia Legal Brasileira: Um Memorando Econômico”, sob a responsabilidade editorial do economista sênior Marek Hanusch, o representante dos empresários amazônicos também defende deslocar os incentivos investidos na pecuária extensiva na Amazônia (para saber mais acesse https://www.andiroba.org.br/artigos/?post_id=5633&artigos_ano=2023)
Além da motivação econômica, a orientação dos estudiosos acerta na necessária otimização no uso de recursos escassos, nesse caso o dinheiro do investimento ou incentivo público, chegando a rebatimentos que poucos se dão conta.
Em primeiro lugar o alvo da otimização econômica é acertado devido à outro fator de produção, por hora abundante na Amazônia, a terra que em 99% das vezes se encontra coberta com floresta.
Dado que a característica primordial de recursos abundantes, repita-se a terra coberta com floresta na Amazônia, é o preço baixo, quanto mais distante das vias de escoamento, rodovias e rios, a terra se encontrar mais barata será para o investimento do capital.
Isso explica aqueles clarões que se observa nas extensões verdes nos mapas em que o capim, verde claro, ocupa uma extensa área. Na verdade, são duas as razões para a pecuária extensiva chegar até ali, naquele lugar inóspito e com acesso, no mínimo, complicado.
Terra barata e crédito público, ou capital, igualmente barato em relação ao que é ofertado no mercado.
Desde muito tempo a atividade de baixa produtividade, em que um animal precisa de quase dois hectares de florestas desmatadas para pastar o capim cultivado, se expande dependendo desses dois fatores.
Enquanto de um lado a terra com floresta, a despeito de ainda muito barata em relação ao centro-oeste e até ao nordeste do pais apresenta elevação constante em decorrência da atratividade de mercado, de outro lado, o capital continua ofertado sob os auspícios do Fundo Constitucional do Norte, do Basa, do Pronaf e assim por diante.
Um rol de incentivos estatais que promovem uma atividade produtiva que depende do desmatamento, oferta quantidade reduzida de emprego e que não compete com nenhuma outra atividade rural.
O mesmo desmatamento combatido com um elevado orçamento público que vem do IBAMA, do governo estadual e de várias secretarias municipais é, ao mesmo tempo, incentivado pelo crédito público à pecuária de baixa produtividade.
Inexplicável esse tipo de operação que resiste ao tempo, que ocorre desde os primórdios da ocupação produtiva da Amazônia, inclusive durante os alvissareiros ciclos econômicos da borracha, um produto florestal que segurou por décadas a economia da região e nunca recebeu incentivo em igual proporção.
Ambos os economistas dos estudos citados no início estão corretíssimos em defender o incentivo a atividades que consigam produzir mais riqueza por hectare que a pecuária de baixa produtividade.
Por óbvio, uma vez que 90% do desmatamento anual vem da criação do boi solto no pasto, a COP30 poderá contribuir para o fim do incentivo público.
Todo mundo gosta de chocolate, um produto que pertence ao exclusivo grupo de alimentos que goza da preferência de todas as sociedades mundo afora, que não possui concorrente direto, que não depende de flutuações na oferta de cacau e, o mais importante, com preço que cabe no bolso de todos.
Tudo depende da origem do cacau. Por sinal, há chocolates para todos os níveis de renda e de classes sociais, dos mais simples aos mais sofisticados, que atendem ao mercado dos produtos mais baratos até aos muito caros.
No primeiro caso, o cacau mais comum será negociado pelo agronegócio internacional como commodities, processado em indústrias espalhadas pelo Brasil e por algum outro país com industrialização um pouco desenvolvida.
Cultivado em monocultivo de larga escala, a produtividade do cacaueiro pode chegar a 1,5 toneladas por hectare, o que permite colocar o Brasil na sexta colocação entre os maiores produtores, sendo que Costa do Marfim e Gana produzem mais de 60% de todo cacau comercializado no mundo.
Todavia, é no segundo caso que entra o cacau nativo da Amazônia.
Nunca é demais lembrar que o cacau tem origem na Amazônia. O fruto foi coletado dos arbustos que crescem sob a floresta tropical com suas árvores de mais de 50 metros de altura, por populações tradicionais, até chegar ao conhecimento dos europeus.
Daí, devido sua atração, ganhou imediato valor comercial, foi exportado e replantado no mundo sendo, há mais de cinco séculos, melhorado em termos genéticos de cultivo para cultivo, sempre com dois objetivos primordiais, resistir a doença e aumentar a produtividade.
Chamada de vassoura de bruxa, a doença do cacaueiro é mortal. Dizima o cultivo e surge sempre que uma quantidade razoável de plantas é colocada no solo com espaçamento típico de monocultivos.
Sendo a Amazônia região de origem do cacau a ocorrência da vassoura de bruxa segue o mesmo princípio. Toda vez que o produtor tenta plantar cacau em monocultivo na Amazônia, a doença dizima o plantio de forma avassaladora com prejuízo elevado.
Por outro lado o cacau nativo, aquele que ocorre no interior da floresta sob a copa das árvores gigantes, além de resistir a doença possui aroma e sabor considerado irresistível e bem superior.
Não é jogada de marketing, mas caso seja, está valendo, posto que existe um nicho de mercado, formado por pessoas que concordam, valorizam e, o melhor, podem e aceitam pagar bem mais pelo cacau nativo da Amazônia.
Não à toa a Mágio, uma fábrica de chocolate de cacau nativo da Amazônia, localizada no Pará, define seu produto como: um chocolate com DNA amazônico e sabor de floresta em pé.
Com investimentos da CBKK (Celo de Bonstato Kaj Konservado) equivalentes a oito milhões de Reais a Mágio vai ampliar suas instalações para duplicar sua compra de cacau nativo junto aos pequenos produtores da região.
Sempre valorizando o cacau nativo e deixando de lado o cacau cultivado em monocultivo a Mágio poderá chegar na COP30, que vai acontecer em Belém em novembro próximo, colocando na mesa o chocolate selvagem da Amazônia.
A Mágio não é a única nem a primeira de uma tendência que coloca o cacau nativo no centro da discussão sobre a bioeconomia com a cara da Amazônia.
Com sugestivo título Dois por Um: Políticas para Atingir Sustentabilidade Fiscal e Ambiental, estudo do Banco Mundial publicado no final de junho último, propõe um conjunto de medidas de política fiscal e ambiental, necessárias para conter as duas crises.
Deixando, para outro artigo, a crise fiscal que parece inevitável, a despeito de sempre negada pelo mesmo governo federal, mesmos políticos e com as mesmas declarações realizadas em 2016 (quando o país enfrentou a pior crise econômica dos últimos 100 anos), o estudo publicado pelos especialistas do Banco Mundial lista os pontos para superar os impactos das mudanças climáticas.
Um rol de quatro medidas de política pública é elencado como antídoto para, de um lado, estancar o processo de ampliação da emissão de carbono e, de outro lado, atender aos compromissos firmados pelos brasileiros quando da assinatura do Acordo de Paris, em 2015.
A primeira medida, que por sinal vem sendo discutida pelo Congresso Nacional, diz respeito à execução do Sistema de Comércio de Emissões, de modo a estipular em cada setor econômico a quantidade possível ou desejável de carbono que poderá ser emitida ou colocada na atmosfera.
Sempre que alguma atividade econômica, daquelas que possui as emissões de carbono documentadas e aferidas com rigor, ultrapassar o índice de cobertura deverá recorrer ao comércio de carbono entre os setores.
Esse tipo de mecanismo de compensação foi testado em alguns países e, sem incluir o agronegócio no caso brasileiro, pode enquadrar setores fortes na composição do PIB nacional em metas aferíveis de emissões de carbono.
A segunda medida, bem menos complexa e de aplicação no curtíssimo prazo, remete à ampliação do investimento público na estrutura física de geração e transmissão de energia elétrica e também de transporte público, sem uso de petróleo e outros combustíveis fósseis.
Sendo o Brasil uma referência mundial devido à elevada participação das hidrelétricas, usinas solares, de biomassa e eólica na matriz de eletricidade, o investimento público poderia ser direcionado com precisão e foco, com resultados quase que imediatos.
Não à toa, a terceira medida orienta a introdução de incentivos ou redução de riscos ao investimento privado para gerar eletricidade renovável e energia para transporte com biocombustíveis.
Os especialistas consideram que o ambiente de negócios para investimento em energia renovável ainda possui riscos desnecessários, devido sobretudo a regulamentação excessiva ou ausência de regras.
Finalmente, como não poderia ser diferente, o Banco Mundial espera que os brasileiros adotem uma atitude mais energética e rigorosa no combate ao desmatamento, em especial na Amazônia.
A taxa medida em 2012, único ano em que o país desmatou menos de 5.000 Km2 na Amazônia, deve ser perseguida com investimento pesado, repetido e mais realista em fiscalização, nos mesmos moldes de 2012.
Também com resultado imediato, os especialistas consideram que o desmatamento na Amazônia pode ser zerado mantendo um orçamento planejado e continuo no aparato de fiscalização, e nos outros instrumentos de política pública inseridos no conhecido sistema de comando e controle.
Resumindo, para o Banco Mundial é possível casar o desmatamento zero e as soluções da crise climática contribuindo para superar a crise fiscal que se avizinha.
Para quem acompanha as discussões sobre mercado nacional e internacional de carbono, o avanço do sistema de somatório jurisdicional, que abrange as emissões de todo o território estadual, pode significar uma importante alteração de rumo.
Bem diferente do mercado regulado e voluntário de carbono, que pode ser acessado por um produtor por meio de uma relação direta de compra e venda de créditos de carbono com uma indústria, o mercado jurisdicional considera o aprimoramento da política ambiental estadual.
O sistema jurisdicional funciona mais ou mesos assim. Com a garantia do governo estadual e federal e, como não poderia ser diferente, contando com a competência do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Inpe, que desde 1988 contabiliza a quantidade de florestas destruídas a cada ano no país, a redução do desmatamento pode gerar créditos comercializáveis de carbono.
Por meio do sistema jurisdicional, a cada diminuição na quantidade de florestas desmatadas em todo território estadual, sempre segundo o Inpe, o governo pode transformar em crédito o estoque de carbono retido com propósito de comercializar no mercado internacional.
Em síntese, algum país, ou uma indústria, que deixou de cumprir sua quota de redução acordada no Acordo de Paris assinado em 2015, para o caso dos países, ou sua obrigação de reter a fumaça na chaminé segundo as regras locais, para o caso de uma indústria, poderá comprar créditos de carbono no mercado jurisdicional.
Existem pouquíssimos exemplos do sistema jurisdicional de cômputo de emissões de carbono acontecendo no país.
O Acre foi um dos pioneiros nesse mercado com o Projeto REDD/REM em cooperação com a GIZ da Alemanha, porém e infelizmente, por razões que não cabem nesse espaço, não conseguiu avançar.
Assim, a experiência inovadora que está em fase de estruturação pelo governo do Tocantins e do Pará, surge como uma alteração de rumo na adoção de um sistema que parecia, depois do Acre, fracassado.
No Pará, que vai sediar a COP30 que acontece em novembro em Belém, foi possível aprovar legislação aplicável para criar um fundo que vai recepcionar o dinheiro da venda de carbono e investir em áreas consideradas prioritárias para estocar carbono, como Reservas Extrativistas e áreas indígenas por exemplo.
Um grupo de empresas que atuam em nível mundial, denominados de Coalizão Leaf, incluindo a Noruega e o Reino Unido, se mostraram interessados em comparar não menos que 12 milhões de toneladas de carbono, no sistema jurisdicional paraense.
Da mesma maneira que no Tocantins, por meio de uma Parceria Publico-Privada, com uma multinacional suíça do setor de energia, a Mercuria Energy Group, foi possível estruturar todo o sistema jurisdicional.
Com o diferencial significativo da garantia (fornecida pelos governos locais e federal) e com o imprescindível suporte científico do Inpe, o sistema jurisdicional fornece tranquilidade ao comprador do carbono.
Enquanto o mercado voluntário e regulado de carbono, caminha na busca de credibilidade, o sistema jurisdicionado nasce com elevada segurança institucional.
Embora tenha sido um dos primeiros a se preparar para o mercado jurisdicional de carbono o Acre, depois do Pará, Tocantins e Piauí, finalmente tomou a acertada decisão de vender créditos de carbono.
Para aqueles que não acompanham o espinhoso tema do carbono abaixo vai uma importante atualização.
Desde o final do século passado e com maior ênfase após a transformação em 2007 do Zoneamento Ecológico-Econômico, ou ZEE, em legislação estadual, dois modelos de investimento em carbono se alternavam no Acre.
Primeiro é importante esclarecer que a retirada de carbono, leia-se fumaça, da atmosfera é um dos mais importantes mecanismos para minimizar e até evitar o efeito trágico da mudança no clima.
Com o aumento da temperatura do planeta indo bem além das flutuações naturais e observadas em modelos matemáticos inquestionáveis, um conjunto robusto de estatísticas identificou o elemento químico carbono como um dos principais causadores do aquecimento do planeta.
Por isso o carbono se converteu no foco das políticas públicas e de projetos vinculados ao mercado. Existem, por sinal, diversas tecnologias para capturar o carbono da atmosfera e manter o elemento químico retido para que não volte à atmosfera.
O plantio de árvores ou a conservação das florestas nativas se mostrou a tecnologia mais barata, rápida e com maior benefício para retirar e reter carbono atmosférico e assim impedir o aumento da temperatura global.
Nesse contexto os países e as empresas, após muitas negociações que começaram em 1992 no Rio de Janeiro, passaram pelo Acordo de Paris em 2015, chegando até a COP30, que será em Belém na capital do Pará em novembro de 2025, se esforçam para tornar atrativo ao investimento privado o que se chamou de mercado de carbono.
Quando a negociação ocorre entre uma propriedade rural especifica que possui as árvores e uma indústria que precisa retirar a fumaça que joga na atmosfera, a negociação se insere no denominado mercado voluntário ou regulado de carbono.
Da mesma forma que quando um território se compromete, por iniciativa do governo estadual, a reduzir o desmatamento em toda sua jurisdição a partir de um ano base para outro, a diferença da quantidade de árvores mantidas gera créditos para o mercado jurisdicional de carbono, pelo desmatamento evitado.
Agentes financeiros de grande porte buscam o mercado jurisdicional para adquirir os créditos de carbono e ofertar para as indústrias que devem comprar os créditos e ter autorização para produzir a fumaça.
No caso do Acre há mais de vinte anos a imprescindível cooperação com a Alemanha por meio da GIZ, primeiro na execução do ZEE e depois com a iniciativa do Projeto REDD/REM, contribuiu de maneira decisiva para modelar o mercado jurisdicional de carbono no território acreano.
Infelizmente, com muita contaminação por uma política pequena, o Instituto de Mudanças Climáticas do Acre, órgão responsável pela cooperação com os alemães e pelo mercado jurisdicional de carbono, foi criado e extinto algumas vezes, até que agora, parece, um sistema de geração de créditos de carbono por desmatamento evitado vai entrar em vigor.
Após longas negociações com o governo estadual, o Banco Standard Chartered, da Inglaterra, vai operar o sistema de geração e venda dos créditos de carbono a serem comercializados sempre que, ou a cada ano que, o desmatamento diminuir no Acre.
Expectativas animadoras dão conta de que nos próximos cinco anos, ou até 2030 conforme o prazo amarrado no Acordo de Paris, seja gerado um total de cinco milhões de créditos de carbono jurisdicional no Acre, que podem ser vendidos por 810 milhões de reais a serem adicionados ao orçamento estadual.
Como uma exigência do mercado jurisdicional, todo dinheiro obtido na venda dos créditos de carbono, deve ser revertido para onde estão as árvores, nas áreas indígenas, em uma Reserva Extrativista ou outra Unidade Conservação.
Espera-se que o governo estadual enxergue no mercado de carbono a principal razão para reduzir a área de floresta destruída todos os anos no Acre.