No momento político atual, em que se observa uma queda de aceitação do governo federal, parece que existe uma combinação: os senadores representam “o Bem”, os deputados, “o Mal”, enquanto o governo se faz de vítima ou de indefeso, à espera do fim da marola de impopularidade.

Uma pantomima desempenhada com maestria durante, por exemplo, a votação do projeto de lei que regulamenta o acesso à biodiversidade, ou ao patrimônio genético – enfim, o projeto que dispõe sobre a exploração dos recursos da diversidade biológica. Não seria exagero afirmar que esse projeto se reveste de importância inigualável para uma região como a Amazônia, cuja vocação florestal tem sido estudada e reverenciada desde os tempos coloniais.

Fácil entender. Se a única saída para consolidar uma ocupação social e econômica na Amazônia é a exploração sustentável da diversidade biológica, encontrada sobretudo no ecossistema florestal, a promulgação de um regulamento para estipular as diretrizes pelas quais essa exploração se concretiza é prioridade absoluta – uma prioridade, diga-se, que se impõe há pelo menos 30 anos.

Infelizmente, todavia, o estabelecimento duma economia ancorada na riqueza florestal sempre perdeu em urgência para temas bem menos relevantes. Cite-se a premência com que o Congresso e o governo aprovaram a despropositada prorrogação, para 2073, do prazo de vigência da Zona Franca de Manaus.

Os parlamentares que discursaram sobre o acesso à biodiversidade acertaram ao fazer três relevantes constatações. Primeiro, que a Amazônia é a região que mais tem urgência nessa regulamentação; segundo, que se trata do mais importante objetivo estratégico com o propósito de gerar riqueza na região, ao tempo em que afasta a floresta do desmatamento; terceiro, que o conhecimento que as populações tradicionais detêm sobre as plantas aproveitadas deve ser remunerado.

Passados os discursos, na prática as coisas não são bem assim. Os senadores, “do bem”, criticando o projeto aprovado pelos deputados, modificaram-no com trivialidades como a substituição do termo “agricultor tradicional” por “agricultor familiar”, e com exigências como a obrigação de associação entre as multinacionais e a indústria nacional (praticamente inexistente no campo da biotecnologia) na pesquisa e exploração das espécies.

No retorno do projeto à Câmara, os deputados, “do mal”, fizeram o esperado: mantiveram as trivialidades e rejeitaram a confusa exigência de caráter xenófobo.

Na verdade, o mais importante, o sentido principal do regulamento (que os deputados recuperaram) é permitir o acesso aos recursos da diversidade biológica às empresas que possuem as condições necessárias – leia-se especialistas e equipamentos – para realizar a exploração dos recursos da biodiversidade e dessa forma melhorar a dinâmica econômica local.

Com a aprovação do projeto, que será ainda analisado pelo Executivo, supera-se toda uma gama de entraves decorrentes de histerias com a biopirataria, de preciosismos com as populações tradicionais e de suscetibilidades em relação ao capital internacional. Esses entraves contaminaram de maneira absurda a legislação instituída em 200.

A completa ausência, na região, de empresas dedicadas ao uso biotecnológico das espécies florestais amazônicas é a prova cabal da impraticabilidade do regulamento anterior, em vigor há 5 anos.

Espera-se que, diante da nova legislação, o Centro de Biotecnologia da Amazônia, CBA, passados mais de 2 anos desde a sua criação, finalmente se torne a prioridade prometida.

O fato para além dos discursos é que o CBA, objeto de exaltação pelos políticos, até hoje não entrou em funcionamento.

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