Se o acesso, por via rodoviária ou fluvial, aos seringais nativos da Amazônia foi consolidado em proporções inéditas, durante a década de 2000, o extrativismo, na condição de modo de produção, e o extrativista, como ator social e econômico, foram expostos ao que se pode considerar seu mais difícil desafio.

Ocorre que, da mesma forma que os benefícios advindos com o fim do isolamento (como serviços de educação e saúde) chegaram aos seringais, também chegou ao interior da floresta a pressão decorrente da madeira, bem como das atividades econômicas que dependem da terra sem florestas. O extrativista, embora vivendo com melhor padrão de vida, foi de certa forma pego de surpresa por essa pressão do capital.

De modo geral, a regularização fundiária trazida pelas reservas extrativistas (e demais formas de reconhecimento da posse dos seringueiros sobre suas colocações) conferiu aos empresários do setor madeireiro e pecuário a segurança necessária para negociar com os extrativistas a ocupação de novos pastos e a extração de madeira.

Assim, na ausência de uma atividade extrativa mais atrativa que a combalida produção de borracha (uma vez que a produção florestal ancorada no extrativismo ainda carecia do aporte tecnológico posteriormente fornecido pelo manejo florestal comunitário), o extrativista foi levado à prática da pecuária e à venda da madeira existente em sua colocação.

É que, com o passar do tempo, o estoque de madeira presente nas reservas extrativistas, em especial nas reservas próximas às vias de escoamento fluvial e rodoviário, despertou a atenção dos empresários do setor madeireiro, cujas fontes de madeira estão sempre em deslocamento, o que traz um risco de escassez permanente.

Uma simbiose nefasta surgiu da relação do extrativista com os compradores de madeira arregimentados pelas empresas – os chamados “toreiros”. Mediante negociações que envolviam ofertas como manutenção de ramais, construção de pontes ou disponibilização de caminhões para transporte, uma quantidade expressiva de árvores começou a ser vendida, em pé na floresta, a preços módicos de 50 reais a unidade.

Como a exploração do recurso madeireiro, nesse tipo de operação comercial, não atende aos princípios básicos da técnica de manejo florestal, a composição comercial entre o seringueiro e o toreiro depaupera o recurso florestal e traz consequências perigosas para a conservação da floresta.

Entretanto, embora eventualmente essa exploração se realizasse ilegalmente, na maior parte das vezes ela era efetuada em conformidade com as normas vigentes e sob o licenciamento ambiental dos órgãos de controle.

O problema é que o quesito legalidade é variável, dependendo da realidade fundiária na qual se encontra o extrativista. Estabelecendo uma ordem de grandeza que vai de um cenário mais restrito, no qual a licitude é difícil de ser alcançada, até uma situação em que a regularização da exploração é facilmente obtida, pode-se dizer que o primeiro caso se aplica ao produtor extrativista que vive nas reservas extrativistas; e o segundo, ao que habita uma colocação situada nas áreas de reserva legal dentro das propriedades privadas.

De qualquer forma, a simbiose nefasta se mantém, pondo em risco o apoio conferido aos extrativistas pelo movimento ambientalista e, o pior, carreando perigosos passivos econômicos e ecológicos para o ecossistema florestal que se espera conservar.

A reversão dessa perigosa realidade – em cujo contexto se logrou resolver o problema fundiário, se ampliou o acesso a vias de escoamento da produção, mas não se conseguiu minimizar o risco da degradação florestal associada ao extrativismo – era uma prioridade.

A elevação do extrativismo, mediante o necessário sustentáculo tecnológico, ao patamar do manejo florestal comunitário é a saída para se manter o imprescindível apoio dos ambientalistas à atividade e, por conseguinte, para se conservar a floresta.

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