Quando a vazão do rio Acre se reduz a cifras alarmantes, com medições que chegam a 1,28 metro, não é preciso muito esforço mental para concluir que abraçar o rio, cantar para o rio e coisas desse tipo não ajudam na discussão para encontrar soluções.

Alarmar, por outro lado, a população, diante da ameaça de racionamento no abastecimento d’água, insuflando um suposto senso de responsabilidade em relação à necessidade de economizar água, como se isso representasse até mesmo compromisso cívico ou patriótico, não ajuda na discussão para encontrar soluções.

Carimbar com a denominação errada de “educação ambiental” a participação de crianças em atividades como recolher lixo e plantar mudinhas no barranco, motivadas por professores e patrocinadas pelo poder público com o objetivo de ocupar os noticiários, não ajuda na discussão para encontrar soluções.

Sob um extenso rol de condutas um tanto ingênuas, um tanto absurdas e um tanto enganosas, as exaltações em favor do rio não resolvem o problema, apenas criam distrações que ajudam a esquecer, como dizem os mais velhos, quem deve colocar o guiso no gato.

O fato é que qualquer enaltecimento romântico ao rio Acre soa, no mínimo, inoportuno, em época de seca extrema, quando a escassez de água e a redução da vazão pode significar uma tragédia ambiental sem precedentes.

Mas incoerência e romantismo não se repelem, e por isso, ao mesmo tempo em que fazem transbordar (com o perdão do trocadilho) seu amor pelo rio Acre, os românticos não se importam em defender a transformação do rio em “eclusas” – uma denominação duvidosa para o que na verdade não passaria de barragens, tais como as das hidrelétricas, contudo levantadas com o único fim de guardar água.

Vale nesse momento reforçar a incoerência: românticos odeiam hidrelétricas.

De outra banda, se romantismo não resolve, o que se deve fazer em contextos como o atual, quando ocorre uma peculiar crise ecológica que por sua vez tem no desequilíbrio do ciclo hidrológico de toda a bacia do rio Acre sua peça-chave?

Compreender e chegar a um consenso quanto ao fato de que o problema reside nesse desequilíbrio e que, em hipótese alguma, se resume à quantidade de água (para menos ou para mais) que corre no leito do rio seria um bom começo.

Considerar a seca atual um fato isolado é um erro grave. A alagação ocorrida em Brasiléia, Xapuri e Assis Brasil no inverno de 2015, bem como a seca verificada nos igarapés, nos rios tributários e assim por diante são ocorrências interdependentes, que reforçam a tese do desequilíbrio hidrológico.

Românticos, como é de sua natureza, vão apelar para os céus. Dirão que a culpa é dos fenômenos climáticos. Românticos gostam de citar El Niño e La Niña e tudo o que evoque as estrelas. Acertam ao remeter a responsabilidade pela seca aos céus, embora esqueçam um detalhe que pode mudar o entendimento, da água para o vinho.

Acontece que eventos climáticos têm seus impactos aumentados ou diminuídos, de acordo com o que encontram em cada realidade, em cada região, em cada lugar. E isso ajuda a explicar muita coisa, afinal o que vem do céu pode causar tragédia, mas só aqui, só no caso do Acre, ou da Amazônia, vai depender de fatores como o tamanho do desmatamento.

O que fazer para estabilizar o ciclo hidrológico da bacia hidrográfica do rio Acre é a pergunta certa a ser feita. Contudo, quem vai colocar o guiso nesse gato?

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