Para quem não lembra, no final de 2018, depois de louvável esforço da gestão Temer para trazer ao país a COP 25 (25ª Conferência das Partes da Convenção sobre Mudanças Climáticas da ONU, que se realizaria em 2019), o Brasil, surpreendentemente, se negou a sediar o evento.

A desistência brasileira, como se sabe, se deu por decisão do governo então recém-eleito, segundo o qual não apenas a COP 25 seria irrelevante, como todas as 24 conferências anteriores não tiveram serventia para o país.

Na deturpada visão dos novos governantes, essa extraordinária mobilização diplomática envolvendo as 195 nações associadas ao sistema ONU em prol da redução das emissões de carbono e mitigação dos efeitos do aquecimento global – e que resultou na celebração do Acordo de Paris em 2015 – teria na verdade o propósito oculto de destruir a economia dos países em desenvolvimento.

A COP 25 foi realizada em Madri, Espanha, e a participação do Brasil só não foi um completo fiasco porque alguns parlamentares e governadores da Amazônia, em face do vácuo de liderança brasileira, negociaram diretamente o apoio de países europeus a programas direcionados a reduzir os impactos das mudanças climáticas na região. (Para saber mais acesse: http://www.andiroba.org.br/artigos/?post_id=4576&artigos_ano=2019).

Além de romper um ciclo de atuação geopolítica reconhecidamente importante e estratégica para a imagem da nação e para a atração de investimentos, o atual governo, a partir do momento em que chegou ao Palácio do Planalto, em janeiro de 2019, parece ter se guiado pelo objetivo de desmantelar a estrutura construída no país para a área do meio ambiente.

Nessa triste cruzada, incorreu em erros elementares e indefensáveis, tais como tentar extinguir o Ministério do Meio Ambiente; sabotar o Fundo Amazônia, principal mecanismo de captação de recursos internacionais para o combate ao desmatamento; desqualificar as estatísticas sobre desmatamento produzidas pelo Inpe, órgão público de inatacável excelência científica; e, talvez o menos inteligente, desdenhar o Acordo de Paris, o mais significativo pacto mundial voltado para minimizar os efeitos do aquecimento do planeta.

Dois anos e sucessivos recordes de desmatamento e queimadas depois, quando os democratas retornam o governo dos EUA e organizam uma cúpula de líderes mundiais apenas para divulgar que transformaram as metas estabelecidas no Acordo de Paris em projeto de Estado, os mesmos gestores – os mesmos que desistiram da COP 25, que desprezaram os milhões de dólares doados ao Fundo Amazônia e que negaram o aquecimento global – se viram agora obrigados a, como se diz, baixar a cabeça e participar do evento.

Pior, ao que parece, sob a tosca alegação de que o Brasil precisa cobrar para abrir mão de um suposto (ou inexistente) direito de desmatar, tentaram infantilmente camuflar o fato humilhante de que, depois de ter esnobado o dinheiro oferecido pela comunidade internacional, estão na verdade com o pires na mão.

Sem embargo, e como já ficou claro, o problema dos atuais gestores do MMA vai muito além dessa facilidade para expor o país a situações vexatórias.

Com efeito, diante do gritante despreparo técnico e do pouco domínio que demonstram acerca das questões ambientais, é patente sua incapacidade para tratar de um assunto considerado prioridade no mundo: desenvolvimento sustentável.

Encontram-se no conceito de sustentabilidade, em especial no que diz respeito à ocupação produtiva do meio rural amazônico, os elementos para compreender o quão distante está a criação extensiva de boi, hegemônica na região, do enfoque conferido à Amazônia no Acordo de Paris.

O predomínio desse novo olhar sobre a Amazônia nas discussões internacionais em torno dos conteúdos relacionados ao desenvolvimento econômico denota a sintonia existente entre desenvolvimento e sustentabilidade.

Com o passar dos anos, a humanidade está cada vez mais consciente, por um lado, quanto à necessidade de valorização e manutenção dos ecossistemas e, por outro, quanto às implicações ambientais decorrentes de modelos perdulários de ocupação produtiva que dependem do desmatamento, seja ilegal ou legalizado.

Dessa forma, é inadmissível que gestores ambientais não entendam o conceito de desenvolvimento sustentável e deixem de identificar as interfaces existentes entre os princípios ali contidos e os que permeiam a visão que orienta o Acordo de Paris em relação à Amazônia.

Não é preciso ir muito longe. As discussões técnicas e políticas desencadeadas em Estocolmo em 1972 foram o ponto de partida para aproximar as noções de desenvolvimento e meio ambiente. Depois, vieram os avanços obtidos nas conferências Rio 92, Rio+5, Rio+10 e, finalmente, Rio+20. Todas, sem exceção, contaram com a participação decisiva da diplomacia brasileira.

Em dezembro deste ano, em Glasgow, Escócia, vai ocorrer a COP 26, evento com maior peso político do que a cúpula ambiental do governo americano – e onde 195 países, sob a tutela da ONU, vão negociar metas mais rígidas para o Acordo de Paris.

A inépcia dos gestores brasileiros pode levar a mais retrocessos e aos prejuízos econômicos deles resultantes. Mas, a despeito da incapacidade de governos efêmeros, existe acúmulo institucional suficiente para possibilitar avanços; por isso, a esperança é que o país logre pelo menos retomar o patamar de 2018.

De sorte que rotular a participação na cúpula ambiental dos americanos como humilhação não leva a nada, na medida em que o foco do problema é a flagrante incompetência e ausência de expertise dos gestores do MMA quanto ao tema da sustentabilidade do planeta.

Não à toa, mais uma vez assumiram uma postura nada inteligente, a de cobrar um preço para não destruir a floresta da Amazônia – que, ao menos até hoje, ainda existe e é nossa. 

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