O cultivo de cacau na várzea do rio Amazonas é uma prática que remonta ao início do processo de ocupação da região. Incluído no conjunto de especiarias a que os colonizadores chamavam de “drogas do sertão”, o cacau nativo da Amazônia sempre apresentou elevada demanda de mercado.

Logo nas primeiras exportações das ditas drogas do sertão, tornou-se imperativo levar o cultivo do cacau para a várzea. Diante da disposição natural da espécie em pequenos povoamentos, com reduzido número de pés, dispersos no sempre inóspito ecossistema florestal, a coleta das sementes de cacau nativo exigia grande esforço e elevado custo.

O comércio das drogas do sertão acontecia por via fluvial: os barcos vinham de Belém, entravam pela foz do rio Amazonas e subiam até os rios Madeira e Purus, regiões de ocorrência do cacau nativo; assim, o produtor ribeirinho não teve dúvida quanto à necessidade de levar o cultivo para próximo da via de escoamento da produção – a margem do rio.

Ante a ausência de tecnologias voltadas para a seleção de indivíduos e melhoramento florestal, os produtores certamente escolhiam as sementes das árvores de cacau segundo uma única variável, a produção de frutos; os pés de cacau que se encontravam dentro da floresta e que, de acordo com as observações do produtor, rendiam mais frutos durante a safra, foram levados para ser cultivados na várzea do rio Amazonas.

Dos idos do século XVII até os nossos dias, um intenso trabalho de assistência técnica, extensão florestal e pesquisa foi desenvolvido, a fim de consolidar a cacauicultura na várzea. O que de fato aconteceu.

Nos últimos quarenta anos, sementes coletadas sob novos critérios de seleção de indivíduos foram levadas para mata ciliar e reproduzidas. Esses critérios dizem respeito não apenas à quantidade de frutos que cada árvore produz por safra, mas também à resistência a doenças como “vassoura de bruxa”, e ainda ao grau de rusticidade do indivíduo, que deve ser apto a suportar as condições impostas nas áreas de várzea.

Dessa forma, caracterizando-se por uma produção de certa forma estável, o cacau vem se mantendo como espécie de permanente importância para a economia da região. A quantidade de toneladas de sementes secas produzidas sofre desníveis acentuados apenas quando ocorrem eventos extremos, como foi o caso da alagação de 2012.

Entre as espécies florestais que originaram a ocupação econômica da Amazônia, o cacau é uma das mais significativas, perdendo apenas para a Hevea; diga-se, aliás, que o extraordinário ciclo econômico da borracha possibilitou ao país a maior riqueza jamais gerada por qualquer espécie florestal. Nem mesmo os ganhos obtidos com o pau-brasil (cuja designação batizou o território nacional) se aproximam da opulência gerada pela borracha.

Contudo, embora não tenha suscitado um ciclo econômico tão pujante como o da Hevea, o cacau se diferencia, em termos de importância econômica, em face de sua estabilidade no mercado ao longo do tempo, que não se compara a nenhuma outra espécie florestal amazônica.

Seria difícil determinarem-se os espaços temporais nos quais o cacau pode ter alcançado um ciclo de maior ou menor demanda. No caso dessa espécie, repita-se, o que tem relevância não é a ocorrência de períodos de grande riqueza, como o da borracha, mas a sua permanência e constância no mercado por um período tão longo.

A renda gerada pelo cacau pode chegar a 10.000 reais por safra, um valor bastante expressivo para o produtor ribeirinho.

Uma renda que poderia ser ampliada se a produção do cacau nativo fosse alçada à condição de política pública – o que, infelizmente, é muito difícil de chegar a acontecer.

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