Encontrar uma saída para o grave problema fundiário que persiste desde sempre na área rural da Amazônia. Essa meta deveria ser reputada como absoluta prioridade pelas políticas públicas levadas a cabo na região, mas não é o que acontece.

Desse modo, o enfrentamento do problema vai sendo protelado, sem que os agentes públicos atentem para o fato de que, sendo condição imprescindível para a organização do espaço e para a adoção de medidas de planejamento da ocupação produtiva, sobretudo no meio rural amazônico, a definição da propriedade da terra deve vir antes de qualquer outra ação de política pública.

Ocorre que a legitimação do domínio fornece a segurança jurídica necessária para a realização de investimentos na unidade produtiva, de forma a ampliar-se a renda ali gerada. Consolidar a produção em uma rotina que lhe permita assumir e honrar compromissos com o mercado é a expectativa do produtor quando possui alguma segurança em relação à propriedade.

De outra banda, os órgãos de controle e monitoramento só poderão imputar sanções às infrações ambientais se e quando a propriedade tiver um dono para ser responsabilizado.

Enquanto em terra firme a regularização da propriedade rural caminha a passos lentos, com ínfimos 0% do domínio legalmente reconhecidos, o que é um grave empecilho para a melhoria da dinâmica econômica local, nas margens dos rios o problema adquire proporções inconcebíveis.

É que o reconhecimento legal da propriedade junto à população ribeirinha esbarra em dois estatutos que o Legislativo brasileiro não consegue discutir a contento: terrenos de marinha e mata ciliar.

No primeiro caso, a legislação destina as terras localizadas nas costas marítimas e nas margens dos rios e lagoas, até determinada distância em direção a terra firme, aos domínios da Marinha do Brasil.

A justificativa para a existência dos terrenos de marinha, que remontam à época da Coroa Portuguesa, é que essa gigantesca faixa de terra precisa estar disponível para a organização de estruturas de defesa em caso de invasão do país. Claro que se trata de instituto superado, que precisa ser revisto.

Já com referência à mata ciliar, as discussões sobre o novo Código Florestal, aprovado em maio de 202, demonstraram o quão polêmico poderia ser o reconhecimento da propriedade dos ribeirinhos que constroem suas residências e instalam seus roçados na mata ciliar dos rios amazônicos.

Mas, como os indivíduos costumam “dar um jeito” diante da omissão estatal, uma parcela considerável dos produtores que vivem às margens dos rios na Amazônia dispõe de algum tipo de instrumento que atesta o seu domínio precário sobre a terra. Esses produtores – que se julgam legítimos donos, embora seu documento de propriedade não seja reconhecido pelo sistema – deveriam ser priorizados em ações de política pública voltadas para solucionar o problema da titulação desses imóveis.

Não se trata de reconhecer a grilagem de terra, como alguns gostam de vociferar, mas de destravar o processo de ocupação da Amazônia.

Sem embargo, não há nenhuma expectativa de que o Estado brasileiro proceda à regularização fundiária da posse exercida pelos ribeirinhos na região. Sem essa regularização, não ocorrem investimentos privados, e um contingente elevado de produtores permanece excluído do sistema oficial de crédito – que, por sua vez, poderia fornecer os recursos necessários para organizar a ocupação na beira do rio.

Sem a regularização fundiária, nada avança. O produtor não investe, os órgãos de controle não controlam e a insegurança se generaliza.

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