É notório, todo extensionista que mantém contato com a produção rural no Acre sabe, dia 05 de setembro, além do feriado do Dia da Amazônia, é também o dia da queimada. Ocorre que, quando chega setembro, o produtor que teve paciência e planejamento para esperar conseguirá realizar uma boa queimada.

Para quem não sabe, uma boa queimada é aquela que queima tudo, todas as sobras do desmatamento ou todo capim velho, para o caso dos pastos já formados. Trata-se de uma queimada rápida e profunda, daquelas que deixam um único tipo de resíduo no solo: cinzas.

Setembro é propício para queimar, pois as condições climáticas são favoráveis: umidade relativa mínima e seca máxima, com um ingrediente importante: ventos.

Todavia, a boa queimada, a que deixa o produtor satisfeito, é justamente a que causa maiores danos às populações urbanas. Por ser rápida e profunda, produz quantidades enormes de fumaça em curto espaço territorial e, o mais grave, de tempo. São toneladas de carbono jogadas na atmosfera de um dia para o outro.

Hospitais lotam, sobretudo com anciãos e crianças. Aeroportos fecham. Olhos ardem e infeccionam. A cidade se cobre de fuligem. O clima fica abafado. Florestas são incêndiadas. Um quadro insuportável, mas que se tolera em nome de uma produção rural, na maioria das vezes, tímida.

Os custos relacionados à concentração de fumaça nas áreas urbanas acreanas seguramente não compensam eventual benefício que essa produção rural possa auferir para a sociedade em geral.

Apesar da ausência de estudos abrangendo as consequências para economia local dessa concentração de fumaça, não seria exagero afirmar que o “Custo Acre” (aquele conjunto de entraves locais que tiram competitividade e fazem com que o sistema econômico como um todo seja mais caro) chega a níveis insuportáveis para a frágil economia local.

No entanto, a tolerância acreana com as queimadas é algo impressionante. No geral, a sociedade local não se manifesta com relação a essa nefasta prática. A queimada é tratada como algo que faz parte da tradição ou da cultura da produção rural: é assim mesmo. Afinal, pensa-se, são somente de quatro a oito semanas por ano, passa ligeiro.

Realmente, o fogo faz parte do sistema nativo de produção agrícola. Os índios já usavam desse artifício e ensinaram aos colonizadores portugueses. Numa época em que a extensão de solo cultivado era relativamente pequena e que a quantidade de fumaça na atmosfera, também relativamente pequena, não acarretava as mazelas atuais, não havia por que se preocupar.

Mas a concentração de carbono na atmosfera chegou a níveis nos quais o planeta não suporta mais. Realizar queimadas no Acre, em Rondônia, no Amapá ou em qualquer lugar aquece o mundo e coloca em risco a existência humana. E isso nós não podemos mais tolerar.

Além, é claro, de empurrar nossas crianças para os hospitais, o que, infelizmente, não parece nos abalar.

Download .DOC

xxxx