A década de 990 foi bastante agitada na Amazônia, e é possível que o Acre tenha sido o que os historiadores chamam de “epicentro” dessa agitação.

Depois da comoção causada pelo assassinato de Chico Mendes, ocorrido em 988, nos anos seguintes o Acre acompanharia a repercussão dessa tragédia na cobertura midiática do julgamento, na quantidade de estrangeiros que aterrissaram no aeroporto de Rio Branco, no expressivo apoio técnico, moral e financeiro recebido pelos seringueiros e nas atenções mundiais, enfim, ineditamente voltadas para a floresta.

Difícil ocorrer, num intervalo de uma década, uma transformação social e econômica tão profunda como a que teve lugar no Acre dos anos noventa. Essa transformação, por seu turno, possibilitou uma mudança significativa no rumo do processo de ocupação levado a efeito no estado – que vinha sendo orientado, essencialmente, para a pecuária.

Atualmente, em 5% do território estadual a floresta foi substituída por cultivos de capim e cana-de-açúcar (citando apenas as comodities mais importantes). Essa proporção poderia chegar no mínimo a 50% sem a alteração ocorrida na estrutura fundiária do estado.

A destinação de uma enorme superfície de terras cobertas por florestas ao uso dos seringueiros – na forma de projetos de assentamentos extrativistas inseridos no Programa de Reforma Agrária e geridos pelo Incra; ou na forma de Reservas Extrativistas incluídas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação e gerenciadas pelo Ibama e depois pelo ICMBio – pode ser considerada a iniciativa mais incisiva em direção a um modelo alternativo de ocupação produtiva que fizesse frente à hegemonia da pecuária.

Mais de um milhão e meio de hectares foram, rapidamente, ainda em 990, transformados nas Reservas Extrativistas Chico Mendes e Alto Juruá.

Na celebração dos 25 anos de surgimento desse instituto inovador, cabe uma reflexão quanto aos resultados trazidos pelas Reservas Extrativistas. A primeira questão a ser respondida diz respeito, obviamente, à relação custo/benefício: o alto investimento realizado pela sociedade brasileira ao desapropriar extensas áreas territoriais e entregar o seu usufruto aos extrativistas foi compensatório?

A resposta é inequivocamente positiva – ainda que seja difícil precificar os retornos obtidos em termos de desmatamento evitado (é muito complexa a tarefa de pressupor como seria o Acre com mais de três milhões de hectares desmatados). Se fosse possível fazer uma comparação, pode-se dizer que durante esses 25 anos os recursos aplicados na criação de Reservas Extrativistas trouxeram muito mais retorno para a sociedade do que o (vultoso) investimento realizado, por exemplo, na pecuária.

Por outro lado, quando se trata de avaliar a contribuição econômica dessa quantidade de florestas destinadas às Reservas Extrativistas, aí são outros quinhentos.

O problema é que a criação de uma Reserva Extrativista tem como objetivo primordial o emprego da tecnologia do manejo comunitário para a produção florestal – o que inclui a exploração de madeira, de animais silvestres (papagaio, paca, queixada, capivara…) e de sementes, para ficar nos exemplos mais rentáveis. Mas essa exploração não acontece hoje, e não há sequer expectativa de que poderá acontecer no futuro.

Sem a alternativa do manejo florestal comunitário, sem conseguir superar as resistências e preconceitos com a produção florestal na Amazônia, as Reservas Extrativistas não fornecem resultado econômico. Os extrativistas continuam a depender da borracha (um produto praticamente extinto no mercado) e da castanha-do-brasil (produto que, embora valioso, não garante sozinho renda florestal relevante).

Passados 25 anos, as Reservas Extrativistas se encontram no limite do retorno social decorrente do desmatamento evitado. Quanto à produção florestal, pode esquecer!

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