Foi o biólogo Garrett Hardin quem cunhou a expressão tragédia dos recursos comuns, para alertar sobre a inevitável exaustão dos recursos naturais (inclusive florestas), explorados por comunidades. Amparando-se em sólidas evidências, o pesquisador concluiu que todo recurso natural submetido à exploração por grupos de produtores seria extinto, pois o egoísmo faria com que cada produtor fosse levado a explorar o máximo do recurso, a fim de obter maiores ganhos e o mais rápido possível.

Haveria duas opções para impedir a extinção da floresta ou do recurso natural explorado pela comunidade. A primeira seria a privatização completa do recurso natural, de modo que uma empresa assumisse a sua exploração e cuidasse da manutenção do estoque. Uma vez que a sobrevivência da empresa dependeria diretamente da existência do recurso natural, a tendência era que essa exploração buscasse a sustentabilidade para evitar riscos de colapso da produção.

A segunda opção seria a estatal. Conforme assinala Hardin, um Estado forte e poderoso poderia sujeitar as comunidades ao cumprimento de regras para evitar a exaustão do recurso.

Sendo assim, as Reservas Extrativistas, por exemplo, concebidas no Acre e disseminadas mundo afora, e cuja sustentabilidade depende da exploração florestal comunitária, estariam fadadas ao fracasso, a menos que houvesse privatização completa ou estatização sob um poder público tendente ao autoritarismo. Vale dizer, duas alternativas difíceis de serem colocadas em prática – sobretudo no caso de regiões como a Amazônia – poderiam evitar a extinção que certamente aconteceria se o recurso fosse mantido sob exploração comunitária.

Posteriormente, muitos autores se debruçaram sobre a tese de Hardin, a fim de demonstrar que ele estava enganado. Ao contrário do egoísmo, individualismo e obsessão por ganhos elevados e rápidos, o produtor inserido em uma comunidade tenderia à valorização do bem coletivo. A fim de garantir sua sobrevivência, a vontade da maioria prevaleceria sobre a vontade de cada produtor isolado.

Francis Fukuyama, em A Grande Ruptura (Rocco, 2000), um estudo sobre a formação do capital social, preleciona que “a tragédia dos recursos comuns nada mais é que um jogo ampliado do dilema do prisioneiro com múltiplos participantes, no qual cada um deles tem a opção entre contribuir para a conservação dos recursos (cooperar) ou usá-los indiscriminadamente (trapacear). Ao contrário de um dilema do prisioneiro com dois lados, este problema não pode ser resolvido com a mesma rapidez através da simples repetição, em particular quando o tamanho do grupo de pessoas que cooperam é grande. Em grupos maiores, os abusos tornam-se muito mais difíceis de detectar. Este problema tem sido objeto de muita atenção por economistas e outros cientistas sociais ao longo da última geração como uma chave para resolver o problema mais amplo da origem da cooperação humana”.

Para Fukuyama, a expectativa de ganhos de longo prazo, ou sustentáveis, faz com que regras para o uso comum sejam cumpridas pela maioria. Afinal, “cada um tem um interesse a longo prazo numa reputação de honestidade, confiabilidade, qualidade e integridade, ou simplesmente de ser um grande benfeitor (…). Analogamente, os baleeiros, criadores ou pescadores que criam regras para exploração sustentada de recursos comuns não estão fazendo isso em nome de um senso de correção ambiental; é do seu interesse que os recursos não sejam esgotados, de forma que possam ter sua justa parcela a longo prazo”.

Ou seja, o produtor tende, por força da natureza humana, à cooperação. O que significa dizer que a comunidade conseguiria se auto-organizar, elaborar regras de manejo florestal e colocá-las em prática, evitando a exaustão da floresta e garantindo a sustentabilidade das Reservas Extrativistas.

Fazer com que a cooperação e a confiança mútua prevaleçam nas Reservas Extrativistas é algo decisivo para a sua sustentabilidade. No entanto, os órgãos públicos responsáveis pela gestão dessas unidades de conservação não parecem entender muito dessa discussão.

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