Sob um extraordinário esforço do aparato de fiscalização, o que exige um dispêndio financeiro proibitivo para as frágeis economias estaduais, certamente é possível derrubar as taxas de desmatamento na Amazônia.

Não obstante, o que mantém as taxas baixas é a política pública. Ligeira análise da curva do desmatamento na Amazônia, desde o início da medição em 988, permite confirmar com certa facilidade essa assertiva. O ciclo de elevação e decréscimo da intensidade do desmatamento é recorrente, com recordes assustadores em 995 e 2004, quando mais de 27.000 Km2 foram transformados (a maior parte) em pastos.

O momento atual parece ser semelhante e, ao mesmo tempo, muito preocupante. Depois que uma redução inédita foi comemorada em 202, quando pela primeira vez o desmatamento atingiu uma área inferior a 5.000 Km2, já no ano seguinte houve um acréscimo de 29%; agora, de acordo com dados preliminares já divulgados, de agosto a julho de 204 houve ampliação superior a 28% em relação ao aumento de 203.

Os números demonstram que o repiquete do desmatamento nos últimos dois anos é um fato. E embora seja cedo para apontar as razões que expliquem o surgimento de um novo e trágico ciclo de destruição das florestas amazônicas, pelo menos três versões devem surgir: a dos governos, a dos ambientalistas e a dos pecuaristas.

Alguns pontos, contudo, devem ser esclarecidos.

Em primeiro lugar, as discussões que levaram à aprovação do novo Código Florestal em 202 expuseram a fragilidade do sistema político bicameral e da relação deste com o Poder Executivo. Num vai e vem sem precedentes, o Código transitou entre o Senado e a Câmara, e entre as duas casas e a Presidência da República, sem que se solucionassem as inconsistências presentes no projeto e que permaneceram na lei aprovada.

A maior parte das polêmicas envolveu dois tipos especiais de florestas, as Reservas Legais e as Áreas de Preservação Permanente, cuja manutenção é imposta às propriedades privadas. Além de confundir conceitualmente essas duas formações florestais, o Código Florestal reduziu, de forma drástica, a quantidade de florestas que deveriam ser mantidas nas margens dos fluxos d’água.

Essa redução põe em risco a quantidade e a qualidade da água que abastece, por exemplo, os reservatórios de hidrelétricas e as áreas urbanas. Ou seja, para garantir um pouco mais de solo para a agropecuária, cometeu-se a imprudência de se desprezar a constatação científica quanto à estreita interação que existe entre água e florestas.

Por outro lado, não pode ser desconsiderado que o atual repiquete do desmatamento apresenta uma dinâmica nova e alarmante. Mais de 80% das florestas desmatadas são áreas inferiores a 20 hectares e estão localizadas em pequenas propriedades. Ao observar-se a distribuição espacial dessas áreas, nota-se que elas se afastam das rodovias, avançando sobre as margens dos rios.

Ainda não dá para saber se essa dinâmica tem ou não vinculação direta com o novo Código Florestal. Os resultados obtidos com a efetivação do Cadastro Ambiental Rural, que levou a eternidade de dois anos para ser regulamentado, poderá esclarecer essa questão no próximo ano.

O Acre surge com destaque no repiquete do desmatamento. Os municípios de Tarauacá e Cruzeiro do Sul, incluídos na lista dos que mais desmataram em julho último, são retratos da nova dinâmica, representada pela presença expressiva da pequena propriedade e do eixo dos rios. Pode ser que a contribuição do Acre nesse novo e perigoso quadro nada tenha a ver com a extinção da Secretaria de Florestas. Pode ser que tenha.

Uma coisa é certa, só uma política pública que atente para o valor da floresta manterá o desmatamento na Amazônia num nível aceitável pelo mundo.

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