Antes de tudo, nunca é demais repetir. A pecuária extensiva, que dispõe da oferta de crédito subsidiado com recursos públicos, é de longe o maior dos males que afligem a Amazônia. E se já houve quem defendesse que o problema estaria na escala, quer dizer, que essa atividade poderia ser adequada ao pequeno e médio produtor, o tempo demonstrou a falsidade de tal argumento.

Ocorre que o desmatamento no Acre assumiu uma nova dinâmica, estando hoje estreitamente vinculado à pecuária praticada na pequena propriedade – a mesma que desenvolve a tão prestigiada “agricultura familiar”. E ocorre que o poder público local tem muita dificuldade em lidar com essa conjuntura. Por duas razões, entre outras.

Primeiro, os políticos não conseguem desagradar ao pequeno agricultor familiar, com receio de perder votos na classe média urbana, algo inusitado embora real; segundo, a administração pública nunca irá alcançar uma estrutura de fiscalização (pessoal, carros, barcos etc.) capaz de monitorar a totalidade das pequenas propriedades dispersas em território estadual.

Voltando à discussão do biodiesel produzido na Amazônia. Não há razões para acalentar a ideia de que a introdução do cultivo, em média e larga escala, de espécies exóticas de palmeiras como dendê ou palma pode ser alternativa a esse novo ciclo do desmatamento na região.

Na verdade, trata-se dum raciocínio ingênuo e equivocado. Parte do princípio que o produtor, a fim de aproveitar a febre mundial do biodiesel, irá ocupar as áreas antes destinadas à pecuária com a implantação de cultivos voltados para a produção de óleo vegetal.

Sem sequer entrar na discussão dos custos associados à recuperação das áreas degradadas por pastagens, que são bem superiores aos custos relacionados ao desmate de novas áreas para cultivo, cabe perguntar: que razão econômica levaria o produtor a trocar a pecuária por óleo vegetal, se ele pode simplesmente diversificar sua produção?

A decisão reside em desmontar o sistema produtivo que lhe rende dividendos todos os anos (criação de boi) ou meramente diversifica-lo, por meio da incorporação de novas áreas ociosas de florestas, que podem ser desmatadas para a produção de óleo vegetal. Ora, como reza a cartilha da produção rural, diversificar é sempre a melhor opção.

A história econômica contemporânea da Amazônia não deixa dúvida quanto ao fato de que só existe uma saída para se evitar a ampliação do desmatamento: aumentar a competitividade da produção baseada no ecossistema florestal nativo da região. Somente dessa forma o país irá honrar o compromisso que assumiu no Acordo de Paris, celebrado em dezembro de 2015.

Lamentavelmente, todavia, tudo indica que a região seguirá o perigoso caminho já trilhado por Malásia e Indonésia – e a própria ONU vem advertindo esses países sobre os riscos da ampliação do desmatamento, decorrente do cultivo de palma para abastecimento do mercado europeu de biodiesel.

O alerta é simples: o custo da restauração florestal para a sociedade será superior à renda privada obtida com a exportação do óleo vegetal.

Mas, se nada disso importa, quem sabe, futuramente, quando a crise na economia estatal for superada, a Amazônia não poderá se converter numa nova Ásia?

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