O surgimento das Reservas Extrativistas foi recebido pelos técnicos e pesquisadores que atuam na área ambiental como uma espécie de tábua de salvação para o processo de ocupação produtiva na Amazônia. Tratava-se de uma categoria especial de Unidades de Conservação que tinha potencial para incorporar à pequena produção florestal o respeito para com a capacidade de regeneração natural do ecossistema.

Finalmente, havia a concreta possibilidade de uma ocupação rural, voltada especialmente para o setor primário da economia, contrapor-se à opção representada pela agropecuária – atividade que, independentemente da escala na qual seja praticada, baseia-se no infausto princípio da substituição da floresta por algum cultivo, ou monocultivo, para ser mais exato.

Além de resgatar uma antiga dívida social do Estado brasileiro para com os seringueiros – que tiveram importante papel na conquista do território do Acre -, reconhecendo-lhes seu direito ao uso do recurso florestal, as Reservas Extrativistas poderiam ainda, mediante a adoção do preceito do uso múltiplo, renovar a forma de exploração dos recursos florestais, ampliando-se assim a cesta de produtos ofertados para além do binômio borracha e castanha.

A Reserva Extrativista, dessa forma, seria a resposta que há muito se buscava para solucionar-se de vez o impasse produtivo na Amazônia. Entretanto, havia um grande obstáculo a ser superado: a tese levantada em 1968 por Garrett Hardin, um biólogo americano, no artigo intitulado “A Tragédia dos Comuns”. Segundo essa tese, os recursos naturais (inclusive as florestas), quando submetidos à exploração por comunidades – ou seja, ao uso comum -, tenderiam à extinção, já que os produtores não respeitariam regras de uso que garantissem a continuidade da atividade produtiva.

Houve um esforço para se demonstrar que, no caso das Reservas Extrativistas, seria possível, sim, estabelecerem-se regras de exploração do recurso – regras essas inseridas na tecnologia do manejo florestal de uso múltiplo, que seriam obedecidas pelos produtores comunitários, de forma espontânea; ou seja, por iniciativa da própria comunidade, os produtores se autorregulariam e estabeleceriam certa ordem social.

O surgimento de uma ordem de modo espontâneo certamente é o primeiro passo para se evitar a tragédia dos recursos comuns, mas é difícil encontrar estudos mais aprofundados sobre o tema.

Contudo, como citado por Francis Fukuyama em A grande ruptura (Rocco, 2000), “Uma exceção é a obra da cientista política Elinor Ostrom, que coletou mais de cinco mil estudos de casos de recursos comuns, um número suficiente para lhe permitir começar a fazer generalizações com base empírica a respeito do fenômeno. Sua conclusão ampla é que as comunidades humanas, em várias épocas e lugares, têm achado soluções para a tragédia dos recursos comuns com muito mais frequência do que se prevê comumente. Muitas dessas soluções não envolvem nem a privatização de recursos comuns (a solução favorecida por muitos economistas), nem a regulamentação pelo Estado (a solução muitas vezes preferida por não economistas). Em vez disso, as comunidades conseguiram criar racionalmente regras informais e, às vezes formais, para dividir recursos comuns de uma maneira equitativa e que não conduz ao seu esgotamento prematuro. Essas soluções são facilitadas pela mesma condição que torna solúvel o dilema do prisioneiro com dois lados: a repetição. Isto é, se as pessoas sabem que terão de continuar a viver umas com as outras em comunidades limitadas onde a cooperação continuada será recompensada, elas desenvolvem interesses por suas próprias reputações, bem como pela monitoração e punição daqueles que violam as regras da comunidade.”

A chave para se evitar a tragédia dos comuns nas Reservas Extrativistas, portanto, está na condição de que as comunidades sejam pequenas e limitadas (como acima se grifou), o que facilita o controle interno. Todavia, para que essa condição se efetive, é imprescindível uma profunda compreensão do conceito de Reserva Extrativista.

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