Segundo matéria publicada na Folha de São Paulo na última terça-feira, 03 de julho, a fábrica estatal de preservativos masculinos localizada em Xapuri, no Acre, conhecida pela marca Natex, demitiu todos os funcionários e encerrou sua produção.

Duas constatações – lamentáveis, diga-se – chamam a atenção na notícia. A primeira, bem visível, diz respeito ao fato de a empresa ser estatal.

Afinal, quem em pleno século 21 e em sã consciência poderia crer na viabilidade de uma produção conduzida por servidores públicos e gerenciada por gestores indicados por políticos?

Mesmo o mais ortodoxo partido de esquerda e mesmo o mais árduo defensor do “patrimônio nacional” (nesse caso, o látex das seringueiras) hão de reconhecer, decerto, o despropósito de tal empreitada.

Menos chocante, mas ainda surpreendente, a segunda constatação remete à localização em Xapuri – bem distante dos mercados (Rio de Janeiro e São Paulo) que consumiam os 100 milhões de preservativos produzidos todos os anos.

Um misto de excesso de otimismo e fundamentalismo ideológico pode ajudar a compreender o caminho percorrido pela Natex até o seu fim, depois de alguns anos de funcionamento.

Tendo exigido investimento público superior a 30 milhões de reais, o empreendimento, desde a elaboração do projeto pela fundação estadual de tecnologia (Funtac), em 2003, foi objeto de grande expectativa.

É provável que o principal motivo dessa expectativa residisse na associação entre a Natex e uma reserva extrativista (Chico Mendes). Como se sabe, a reserva extrativista é uma categoria de unidade de conservação voltada para a exploração da biodiversidade florestal, o que inclui tanto madeira quanto borracha.

Não à toa, a justificativa para os elevadíssimos custos com a desapropriação dos mais de 970 mil hectares de terra destinados à Resex Chico Mendes se assentava na produção de borracha levada a efeito pelas mais de 2.000 famílias de seringueiros ali residentes.

Por sua vez, a razão primordial para concluir que a fábrica era a solução para assegurar a conservação de parte considerável da floresta presente na resex firmava-se no fato de que 700 famílias forneceriam o látex para a confecção dos preservativos.

Esse acordo comercial entre a Natex e a resex, de outra banda, garantiria renda permanente em todas as safras anuais de látex para os extrativistas.

Uma renda que, acreditavam os gestores públicos e os ambientalistas, afastaria definitivamente os produtores dos atrativos econômicos representados pela criação de boi e consequente substituição da floresta por capim.

Nada disso aconteceu, embora o discurso do governo se mantenha numa defensiva irritante e, obviamente, desnecessária. Questões operacionais, vinculadas à logística e à disciplina dos seringueiros, levaram a Natex a, gradualmente, passar a comprar o látex de seringais cultivados em fazendas de gado.

A expectativa em relação à Natex também decorreu de sua ligação com a cidade de Xapuri. Ao oferecer vagas de trabalho para mais de 150 operárias, a empresa era uma opção de renda para mulheres com pouca ou nenhuma perspectiva de ocupação laboral no interior do Acre.

Passado o tempo, o otimismo se esvaiu, as expectativas desmoronaram, e até o fundamentalismo ideológico que defendia a estatização da Natex se rendeu à realidade: a lei de privatização foi aprovada pelo governo em 2016.

Infelizmente, a Natex faliu antes de ser privatizada, evidenciando o descaso do governo com a política florestal estadual.

Uma coisa é certa: no Acre, a saída pela floresta vai ter que esperar.

 

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