O que levou o governo federal a esperar dois anos para publicar o decreto que regulamenta o Código Florestal é algo difícil de saber. As defensivas oficiais dão conta da existência de um complexo processo de negociação entre os representantes do agronegócio e das organizações ambientalistas. Mas o que, precisamente, foi objeto de negociação não é esclarecido por ninguém.

Para entender melhor. Em 25 de maio de 202, a Presidência da República sancionou a Lei 2.65, que instituiu o que se chamou de novo Código Florestal, alterando de maneira significativa o segundo Código Florestal brasileiro, que vigorava desde sua aprovação em 965 (o primeiro Código Florestal data de 934).

O processo de discussão e aprovação do Código Florestal, além de ter levado mais de seis anos, foi marcado por grande dificuldade de compreensão (por parte dos parlamentares) quanto às condicionantes técnicas que dizem respeito aos temas mais controversos – por exemplo, as formações florestais e sua relação com a água.

Essas dificuldades, associadas à vontade de agradar aos atores vinculados ao agronegócio, acarretaram inúmeros descompassos entre o Senado, a Câmara dos Deputados e o Executivo.

Simplificando: os deputados aprovaram uma proposta que agradava ao agronegócio e punha em risco porção significativa de florestas, localizadas sobretudo na mata ciliar dos rios. Os senadores, tentando por sua vez atender os ambientalistas, minoraram o risco de supressão de florestas; por fim, a Presidência decidiu pela aprovação de uma terceira proposta, mais próxima à dos senadores e atribuindo tratamento diferenciado à agricultura familiar.

As questões polêmicas se referiam à manutenção da porção de reserva legal nas propriedades e à definição da largura da faixa de mata ciliar que deveria ser mantida ao longo dos cursos d’água.

Todavia, quanto a essas questões, mesmo após a aprovação do Código, seria necessário a edição de um decreto, a fim de regulamentar a matéria. Essa norma regulamentadora só agora foi promulgada. Trata-se do Decreto 8.235, publicado em 5 de maio de 204 – e que, para esmiuçar tópicos como a recomposição da vegetação retirada da margem dos rios, instituiu o Cadastro Ambiental Rural, o Programa de Regularização Ambiental e o Programa Mais Ambiente Brasil.

Com a criação do Cadastro Ambiental, os proprietários rurais poderão, a partir de agora, mediante o cumprimento de um rol de condições, inserir dados de georeferenciamento de suas terras (como a localização da reserva legal e da faixa de mata ciliar) num sistema informatizado – o Sicar. Esse cadastramento regulariza a propriedade perante a legislação ambiental e, dessa forma, o produtor se habilita a acessar o sistema oficial de crédito.

Por sua vez, o Programa de Regularização se volta para os estados. Por meio desse programa, os estados podem assessorar o cadastramento das propriedades no Sicar, depois que as regras para recuperação, recomposição, regeneração ou compensação da mata ciliar são definidas e negociadas.

Finalmente, o Programa Mais Ambiente Brasil se destina a apoiar todo o processo de regularização das propriedades rurais, mediante a promoção de uma série de ações – tais como assistência técnica, extensão rural, produção de sementes e mudas de espécies nativas da mata ciliar, e capacitação de gestores na área ambiental.

O advento do Decreto 8.235/204 é motivo de comemoração, já que, finalmente, se conferiu efetividade a uma parte importante do Código Florestal. Mas não se justificam dois anos de atraso.

Além de tardia, a publicação do decreto neste momento reforça a tese de que a gestão pública caminha seguindo o rastro do calendário eleitoral. Lamentável.

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