No território boliviano, uma extensa região, que vai de La Paz até o Norte, em direção à fronteira com o Peru, pode estar ameaçada pela seca; seguramente, está ameaçada pela erosão.

No primeiro caso, as mudanças climáticas e o conseqüente aquecimento global – que, por sua vez, é responsável por uma inevitável crise ecológica já comprovada pela ciência – parecem causar um inusitado impacto no denominado altiplano boliviano: a seca.

Inusitado, porque a região é constituída por uma imensa cadeia de montanhas, que formam a Cordilheira dos Andes, com poucos vales presentes entre uma e outra elevação. Multíplices veios de água escorrem pelas montanhas, irrigando os poucos fundos de vale – que, por isso, apresentam certa fertilidade, mesmo se tratando de solos arenosos e pedregosos, como o são os do altiplano. São esses veios de água que fazem com que o Lago Titicaca apresente a dimensão que possui.

O risco da seca, por sinal, caso venha a se concretizar, reduzirá o volume da água que escoa, comprometendo a majestosa paisagem do Lago Titicaca – provavelmente, o mais expressivo destino turístico boliviano.

Ao se trafegar pela rodovia que vai da capital, La Paz, até a cidade fronteiriça de Copacabana, é possível observar-se o elevado estágio de erosão nas montanhas. Mais que o risco da seca, a erosão é uma realidade visível.

Ocorre que, para ocupar – de maneira permanente e com um contingente considerável de pessoas – uma região com mais de 3 mil metros de altitude, baixa umidade relativa, frio intenso e relevo acidentado, a civilização que formou o chamado Império Inca desenvolveu um primoroso sistema de produção agropecuária. Esse sistema, baseado na construção de terraços nas montanhas, e voltado, sobretudo, para o cultivo de batatas e milho, e para a criação de porcos e cordeiros, até hoje impressiona a engenharia agronômica.

O terraço inca, formado por pequenos espaços – com área inferior a um hectare – cercados por muros de pedra (uma matéria-prima abundante) de 1,5 metros de altura, viabilizava (e ainda viabiliza) a produção agrícola no relevo acidentado, mesmo nas elevações mais íngremes.

Em que pese a pequena escala da produção realizada, isoladamente, em cada terraço, a quantidade de terraços distribuídos por todo o relevo possibilitava alimentar uma população estimada em mais de 500 mil pessoas.

Essa tecnologia inca vem sendo praticada até hoje. Todavia – seja em razão do aumento da escala, ou em vista da introdução da sempre perigosa pecuária bovina, ou ainda, por causa da ausência de vegetação nativa em toda a área -, o fato é que o sistema não consegue evitar o processo erosivo, em franca expansão.

A combinação entre clima, altitude, relevo, e modelo de ocupação social-econômica na região inca da Bolívia poderá desencadear um irreversível (ou muito difícil de reverter) processo de desertificação: faltam árvores no altiplano boliviano. A desertificação, por outro lado, no médio prazo, certamente irá comprometer a produção agropecuária e o turismo, as duas principais referências para a economia local.

Continuando na estrada, no sentido La Paz-Cochabamba, e daí até Santa Cruz, manchas de plantios de árvores começam a surgir, contrapondo-se à paisagem da desertificação. São plantios de eucalipto, gênero que possui mais de 600 espécies – alguma delas tinha que ser adequada àquela altitude.

Que o eucalipto pode resolver o problema econômico, auferindo renda superior à da agropecuária, não há dúvida. Mas, será o eucalipto a espécie de árvore mais apropriada para que o altiplano boliviano não se transforme em deserto?

Melhor perguntar aos incas.

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