Reza o folclore futebolístico que, numa reunião entre jogadores e equipe técnica da seleção em torno da estratégia a ser adotada num jogo contra a Rússia, ficou decidido que Garrincha deveria driblar os marcadores, chegar à linha de fundo e cruzar para Pelé cabecear e marcar um gol.

Sem compreender como o planejamento conduz à consecução de metas e objetivos – e por isso um gol, desde que planejado, fica mais fácil de ser alcançado –, Garrincha responde: “Ok! Mas já combinamos com os russos?”

O emprego e o apoio a processos de planejamento em programas de educação, saúde, segurança e controle do desmatamento tem sido o foco e a essência da cooperação alemã para o Brasil e, neste último caso, para a Amazônia.

Atuando por intermédio de sua agência de cooperação internacional, conhecida pelo acrônimo GIZ, os alemães difundem em todo o mundo um tema pelo qual têm obsessão, que configura verdadeira vocação nacional: a concepção e aplicação de métodos de planejamento.

Para os alemães, todo projeto de desenvolvimento pode ser concretizado com sucesso por meio da utilização de um método eficaz de planejamento – seja de curto, médio ou longo prazo.

Nada mais desafiador, impossível deixar de reconhecer, para um povo que é planejador por natureza, levar uma cultura sem tradição nessa área, como a brasileira, a incorporar, na execução de políticas públicas, técnicas de planejamento, ainda que elementares.

No que concerne à Amazônia, é inegável a importância da cooperação técnica e do dinheiro doado pelos alemães. A lista dos projetos que contam com o apoio da GIZ na região é interminável, merecendo destaque a prioridade conferida ao monitoramento e controle do desmatamento.

Não à toa, a maior parte dos estados amazônicos, por insistência e devoção quase religiosa dos alemães, logrou levar a cabo em seus respectivos territórios o zoneamento ecológico-econômico, ou ZEE.

Considerado um marco decisivo para o macroplanejamento da ocupação produtiva de uma determinada região, no contexto amazônico o ZEE serve para definir as zonas destinadas ao agronegócio e à agricultura familiar, onde o desmatamento é permitido; e também para delimitar as terras reservadas à exploração comercial da biodiversidade florestal, onde, por óbvio, não se pode desmatar.

Depois de concluído o ZEE, chega-se a um mapa de gestão territorial da produção rural; esse instrumento possibilita que as ações de fiscalização estatal, cujos custos são exorbitantes para a sociedade, tragam resultados mais efetivos.

Os fracassos observados na condução do ZEE nos estados se devem, sem nenhuma dúvida, à dificuldade intrínseca aos produtores, gestores – enfim, aos atores sociais da Amazônia – para assumir e implementar as diretrizes pactuadas e planejadas durante as negociações, mesmo quando essas diretrizes são convertidas em legislação estadual.

Se a Garrincha parecia difícil entender o valor do planejamento, deve ser incompreensível para os alemães da GIZ a postura assumida pelo governo federal, que desconsiderando todo o caminho percorrido e os avanços obtidos pela cooperação internacional na Amazônia, tira do obscurantismo uma visão anacrônica, há muito superada, e se vale de um nacionalismo retrógrado para defender uma noção de soberania tosca e perniciosa sobre a região.

Todo êxito alcançado no controle do desmatamento até 2018 tem a contribuição dos alemães – justamente em função do compromisso que assumiram, por mais de quatro décadas, com a conservação da Amazônia. Compromisso este que não pode ser abalado pela incompetência de um mandato governamental.  

Vamos admitir, planejamento não é mesmo o nosso forte: como diria Garrinha, é melhor contar com os alemães!

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