Cederem-se os dedos para não se perderem os anéis… O avesso do conhecido provérbio é o lema que pode ser aplicado às negociações políticas sempre que está em jogo o tardio dilema entre conservar a floresta e ampliar a produção agropecuária. Ocorre que o solo, infelizmente, é um só – o que significa dizer que onde há florestas não pode haver criação de boi. E vice-versa.

Pois, ao que parece, a renúncia dos dedos em favor dos anéis foi justamente o que aconteceu no dia 29 de agosto último, quando os parlamentares que se definem como ruralistas (ou seja, os que acreditam que a melhor estratégia de desenvolvimento para o país é a produção de grãos de soja e carne de boi) convenceram os que se definem como não ruralistas (já que não existe uma bancada de parlamentares ambientalistas) a aprovarem um novo texto para a Medida Provisória 571/12, conhecida como MP do Código Florestal.

É difícil entender-se o processo legislativo nacional – pelo qual uma proposta de legislação passa por intermináveis idas e vindas entre a Câmara dos Deputados e o Senado, com a intermediação, vez ou outra, da Presidência da República. É desafiador para o cidadão conseguir acompanhar e, claro, compreender o que acontece por lá.

Mas, a novela em que se tornou a discussão do novo Código Florestal é, mais ou menos, a seguinte: o primeiro ponto importante a ser frisado é que a justificativa para se discutir uma nova lei florestal para o país foi o fato de que uma boa parte dos produtores rurais se encontrava em situação de ilegalidade perante o Código de 1965. Ora, de acordo com o nosso sábio discernimento tupiniquim, se não se cumpre a lei, melhor mudar a lei – de modo que os infratores passem para a legalidade.

Assim, em maio de 2011, os deputados aprovaram uma proposta de novo código florestal, que era absurda em três pontos: anistiava os produtores quanto às multas já cominadas; reduzia ao mínimo as florestas das margens dos rios; e quase acabava com a exigência de manutenção das florestas existentes nas áreas de reserva legal (equivalentes na Amazônia, a 80% da área total da propriedade privada).

Os senadores, que consideraram a proposta pouco elaborada, sobretudo sob o ponto de vista técnico, recuperaram a exigência da mata ciliar e da reserva legal; também incluíram uma série de mecanismos para ampliar a valorização dos ativos florestais, e flexibilizar a anistia concedida, mediante o parcelamento das dívidas existentes (tendo sido mantida, contudo, a obrigação de pagar).

Ao voltar para Câmara em caráter terminativo, a proposta dos senadores foi repudiada pelos deputados, que, melindrados com o acordo feito no Senado, aprovaram, novamente, sua própria versão, sob a mesma a redação tacanha que havia sido apresentada aos senadores.

Coube à Presidência da República vetar a parte do texto dos deputados que se referia aos temas da anistia, mata ciliar e reserva Legal – sendo que esses tópicos foram incluídos na MP 571/12, que foi submetida à Comissão Mista do Congresso Nacional.

Enfim, a proposta aprovada no final de agosto pela Comissão Mista – e que será votada pelo plenário da Câmara e do Senado – altera a largura de mata ciliar exigida nas propriedades rurais, reduzindo, obviamente, a quantidade de florestas.

Os parlamentares não ruralistas tiveram que entregar os dedos para não perderem os anéis porque os ruralistas ameaçavam aprovar o fim da mata ciliar para os rios que secam, os denominados intermitentes – o que traria um prejuízo incalculável à manutenção dos recursos hídricos no país.

Aceitou-se a redução das florestas que protegem os rios que não secam no verão, para manter-se a proteção, com um mínimo de florestas, para os rios que secam.

Um acordo que sairá caro ao país, ao retirar a proteção das florestas para um recurso estratégico – a água. O movimento “Veta Dilma de novo” já começou.

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