Enquanto as primeiras Reservas Extrativistas criadas em território nacional (Chico Mendes e Alto Juruá, ambas no Acre em 1990) avançam no inexorável caminho da criação de boi, a ampliação anual do desmatamento praticado no lado de dentro dessas áreas se iguala às taxas observadas no lado de fora.

Essa constatação leva inevitavelmente à conclusão de que o expressivo investimento realizado pela sociedade para a desapropriação das terras hoje ocupadas por essas unidades de conservação, no intuito de garantir aos extrativistas sua subsistência sem o desmatamento da floresta, pode ter sido um grande erro.

Acontece que se acreditava, na década de 1980, que as demandas dos extrativistas se restringiam à regularização fundiária das glebas por eles habitadas: bastaria promover a desapropriação dessas áreas, assegurando-lhes a posse, que a conservação da floresta aconteceria naturalmente, como mera decorrência.

Exemplos de uma produção florestal robusta e capaz de evitar o desmatamento não faltaram. Por meio da tecnologia do manejo florestal comunitário, os três primeiros Projetos de Assentamentos Extrativistas, PAE, criados no Acre (Cachoeira, Porto Dias e São Luís do Remanso) lograram ganhar dinheiro com a exploração sustentável de madeira.

A experiência de manejo comunitário no PAE Porto Dias, por sinal, tornou-se uma referência na Amazônia e foi certificada pelo Conselho Internacional de Manejo Florestal (FSC, da sigla em inglês). O selo do FSC, reconhecido em todo o mundo, representa a garantia de que a produção de madeira não causou danos à floresta.

Mas o sucesso alcançado no PAE não chegou às Reservas Extrativistas, que passariam a década de 1990 submergidas nas indefinições (em termos de interpretação normativa) quanto à possibilidade/impossibilidade de explorar madeira.

Na verdade, a despeito de nunca ter havido restrição legal para o manejo de madeira, o fantasma da ilegalidade sempre emperrou a produção florestal nas Reservas Extrativistas da Amazônia e até hoje configura o mais grave empecilho à sustentabilidade dessas unidades. Na ausência de alternativas, as Resex se encontram cada vez mais expostas à ampliação do desmatamento para a criação de boi.

E se antes era apenas a produção de madeira que era penalizada pelo preconceito e pela desinformação, adicione-se aí, atualmente, a fauna silvestre. Apontados como principais produtos, em valor monetário, depois da madeira, os animais silvestres podem ser caçados pelos extrativistas sob o pretexto da subsistência, mas não podem ser manejados para venda.

Ou seja, embora não exista prescrição legal impedindo o manejo de fauna nas Resex, é praticamente impossível obter o licenciamento da atividade junto aos órgãos de controle. Não é preciso dizer que, sem manejo, o risco de extinção é inevitável.

A supressão dos entraves criados pelo ICMBio, o órgão público responsável pelo gerenciamento de mais de 15% das terras na Amazônia, seria um bom começo para a viabilização das Reservas Extrativistas.

E, de forma exemplar, se a Reserva Extrativista Chico Mendes, uma das maiores da Amazônia, com 970 mil hectares, conseguisse finalmente pôr em prática o manejo florestal comunitário voltado para a produção de madeira, isso inauguraria um novo patamar produtivo para os extrativistas.

Essa deveria ser a prioridade da gestão pública florestal, que, como indicou auditoria do Tribunal de Contas da União, patina, patina, e não vai a lugar nenhum.

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